Opinião

Afinal de contas o que há de novo na hotelaria?

*Artigo de Mário Cezar Nogales

 

Se o leitor parar pra pensar um pouco vai perceber que há pouca ou nenhuma novidade de fato. A não ser um novo software ou um novo app para seu smart phone ou tablet o que não passa de uma nova versão do que já conhecemos desde a década de 1990, nada mais e nada menos que uma redundância na tecnologia existente com uma necessidade maior de hardware o que nos leva a velha história da obsolescência programada, também chamada de obsolescência planejada, é quando um produto lançado no mercado se torna inutilizável ou obsoleto em um período de tempo relativamente curto de forma proposital, ou seja, quando empresas lançam mercadorias para que sejam rapidamente descartadas e estimulam o consumidor a comprar novamente. 

  

Esse fenômeno é comumente associado ao processo de globalização, entretanto, o seu início está vinculado à Grande Depressão de 1929. Durante a profunda crise econômica que marcou esse período, diante de um mercado consumidor impotente, observou-se que havia muitos produtos industrializados em estoque e que não eram comercializados, diminuindo o lucro das empresas, aumentando o desemprego e, consequentemente, reduzindo o consumo e aumentando a crise.

  

Diante disso, observou-se que produtos duráveis desfavoreciam a economia, pois reduziam o consumo. Entre os economistas norte-americanos, tornou-se popular o jargão “Um produto que não se desgasta é uma tragédia para os negócios”.

 

O exemplo mais citado por estudiosos, críticos e especialistas no assunto foi um cartel organizado por grandes empresas que produziam lâmpadas e o governo americano ante a crise. Eles se organizaram para reduzirem o tempo de vida útil de uma lâmpada a fim de aumentarem as vendas dos produtos. Sabe-se que a primeira lâmpada inventada durou cerca de 1.500 horas; no início do século XX, as lâmpadas tinham uma vida útil média de 2.500 e há noticias de lâmpadas que são utilizadas desde 1901 pelo corpo de bombeiros de Livermore, norte da Califórnia nos Estados Unidos. Entretanto, após a Grande Depressão e a formação do cartel, o tempo de vida útil foi reduzido abruptamente para 1.000 horas.

 

Outra exemplificação dessa situação foi o caso do lançamento do iPad 4, da empresa Apple, que foi processada pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática por lançar a versão poucos meses depois de ter colocado em circulação o iPad 3. Os usuários desse produto, diante do lançamento de uma nova versão que praticamente não apresentava diferenças técnicas, viram o seu produto como obsoleto e procuraram comprar a nova versão. Vale lembrar que essa não é uma ação de uma única empresa, mas uma tendência coletiva de mercado.

 

A qualidade é influenciada pela obsolescência programada

Em vários artigos já expliquei o que se trata quando falamos de qualidade, e obviamente que estes artigos se perdem no tempo, principalmente na internet onde o tempo é uma coisa incrível, mas não deixemos de nos lembrar de que a qualidade está intimamente ligada a fatores pessoais e práticos, afinal de contas a qualidade é subjetiva e é diferente para cada individuo já que se trata de expectativas geradas e criadas muitas vezes pelos próprios hotéis, contudo vale lembrar que a qualidade sempre estará ligada aos seguintes pontos:

·       A necessidade que o individuo têm

·       Experiencia anterior

·       Expectativas geradas por propagandas e informações de usuários

·       Preço

·       Nome ou marca do produto

Logo, se a grande maioria das pessoas está continuamente conectada, informação é o que não lhes falta e se o seu hotel não proporciona um acesso à internet igual ou melhor que a casa do hóspede ou mesmo que o escritório onde ele trabalha, a qualidade de seu hotel vai ficar ver navios.

 

Obviamente que a questão da qualidade do sono onde a influência está diretamente ligada ao colchão, lençóis, travesseiros, limpeza e ruídos externos sempre serão avaliados e a qualidade do banho influenciado pela agua, temperatura, sabonetes, shampoos e toalhas sem que nos esqueçamos do carro chefe que é o atendimento pessoal e um café da manhã inigualável.

 

Nenhum destes atributos são obtidos por máquinas, logo, os erros surgirão e o que seria da humanidade se não houvesse erros? Tornar-nos-íamos Borgs? (Para quem não sabe ou não se lembra, Borgs são uma espécie alienígena, meio máquinas meio humanos, na serie A Nova Geração baseada em Jornada nas Estrelas). É a solução destes erros que torna a experiencia com a qualidade maior ou menor, pois erros são de fato ações fora dos padrões esperados e na hotelaria os fazemos com olhar clinico e atento do hóspede.

 

Tomemos o seguinte exemplo:

Com a atual histeria com relação à propagação de germes, o colaborador da copa que manipula os alimentos sem o devido cuidado e o uso de luvas plásticas pode gerar um enorme conflito de qualidade quando observado por um hóspede, contudo, o hóspede não percebe que esta luva possa estar sendo usada sem a devida troca no tempo correto determinado pelos “papas” da higiene que é a ANVISA e sem o conhecimento correto, mesmo o hóspede que está observando com a “caramiolas” que tem de acordo com o que conhece pode questionar a qualidade deste serviço, agora imaginem todo o processo que foi realizado para se obter uma simples fatia de presunto processado industrialmente, quantos conservantes químicos que desconhecemos estão presentes e quantos processos que não vemos? Quando tínhamos processos manuais que são aclamados de excelente qualidade até hoje quando importamos um “prociuto di parma” ninguém sequer questiona o processo envolvido a não ser a manipulação correta do individuo que está lá fatiando e arrumando o produto. Agora tomemos o exemplo que este indivíduo que está preparando o café da manhã seja um Chef de nome conhecido internacionalmente, alguém irá questionar se ele está usando luvas?

 

Ensino não é educação

Como vimos no exemplo acima o ponto importante na questão da qualidade é o grau cultural do hóspede, não importa se este tenha ou não mestrado, de nada irá valer se ele não tem a devida cultura ou o conhecimento da cultura envolvida, como disse anteriormente, a qualidade é uma questão subjetiva e de nada vai adiantar você dizer que o “prociuto di parma” é melhor se o hóspede não conhecer sequer os processos envolvidos, afinal de contas, presunto feito em casa como é o feito em Parma (Itália) é um processo de putrefação controlada até que se obtenha a conservação com a gordura do animal o que prolonga em muito o tempo para o consumo. Este processo em particular foi desenvolvido porque justamente não havia geladeiras e foi uma maneira que nossos antepassados conseguiam manter seus alimentos estocados por maior tempo sem que estragasse pela falta de refrigeração ou congelamento.

 

Infelizmente desde a década de 1970 o ensino em nossas escolas, seja público ou privado vem em constante declínio, pois o que seria feito para que houvesse maior numero de pensadores e solucionadores de problemas, o que de fato é o correto ensino universitário, temos apenas repetidores de conhecimento abstrato e não é atoa que o quê se aprende em nossas universidades é colocado pelos próprios estudantes de que não se aplica na realidade. Em plena era da informação estamos ávidos por conhecimento, pelo raciocínio e pela busca via internet encontramos muitas informações que nos auxilia no entendimento de nosso mundo.

 

Bom senso é a estratégia

Quando falamos de qualidade, nada melhor do que usar o nosso bom senso, relembrando que a qualidade está ligada às expectativas geradas pelo hóspede e de que é uma questão muito subjetiva, o bom senso que temos serve para que obtenhamos o conhecimento do que é qualidade quando perguntamos o que necessita, aprecia e deseja para sua hospedagem.

Observe este exemplo, nós hoteleiros temos o costume de envelopar as camas para uma perfeita apresentação, porém nos esquecemos de perguntar se o hóspede assim prefere e dai temos os relatos das constantes brigas com os lençóis antes deste se espreguiçar confortavelmente no colchão, uma simples pergunta bastaria:

 

– Como gostaria que arrumássemos a sua cama, envelopada ou solta?

 

Isto com certeza iria surpreender seu hóspede o que lhe daria o senso de um atendimento especial, afinal de contas, quem lhe pergunta isto? A resposta, mesmo que pareça absurda é um uníssono quase ninguém apenas um que outro maluco em um hotel pequeno que tem tempo de atender o hóspede, nós que somos hoteleiros profissionais temos milhares de UH’s para atender e isto se tornaria impossível (mesmo com a tecnologia existente). Muitos também diriam que isto não é nossa preocupação, hóspedes preferem o seu sinal de internet perfeito, o que não deixa de ser verdade quando observamos um lobby ou um salão de café da manhã onde todos os humanos estão entretidos com seus gadgets (inclusive os colaboradores) e quando menos se percebe, aquele colaborador que pouco usa a internet pergunta ao hóspede se ele quer um pão na chapa ou outra iguaria que poderia lhe apetecer. Naquela singularidade entre o colaborador e o hóspede que foi atendido surge, de forma inata, a alta qualidade que sempre desejamos ter no hotel afinal de contas, hotéis são meios de atender um viajante solitário que deseja a única coisa que temos de fato neste planeta: CALOR HUMANO.

 

O que de fato é novo na hotelaria

Infelizmente aqui em nossas terras o que é novo já foi visto a mais de 20 anos no estrangeiro e será que precisamos esperar mais 20 anos para perceber o que de fato é novo na hotelaria?

 

Acabei de discorrer sobre qualidade e sua subjetividade e parece que ainda há vários hoteleiros que não se deram conta de que a novidade na hotelaria de fato não é nada novo.

 

Estamos vivendo em uma era em que o tempo é uma preciosidade, nos enchemos de ferramentas para que tenhamos mais tempo, afinal de contas podemos ter nossos escritórios em qualquer canto do planeta, basta um bom computador e uma linha de telefonia celular que conseguimos. Trabalhamos em casa, nas horas vagas, no escritório, em nossas viagens e nos esquecemos do que de fato é estar entre os seres humanos.

 

A hotelaria que já percebeu isto está proporcionando aos seus hóspedes experiências únicas em seus hotéis, levando em consideração o fator tempo para si e percebam em quanto estamos atrasados com relação a isto.

 

Quando construímos hotéis e pelas preconcepções que temos do que são os meios de hospedagem, sempre consideramos a parte de descanso e lazer com ambientes de bibliotecas, salas de ginastica, salas de jogos, saunas, piscinas e outros tantos que ficam acumulando poeira e sendo palácios para as aranhas pela falta de uso ou procura e como somos teimosos a ponto de colocar estas estruturas como pontos chave de qualidade e de conforto pouco nos importamos com o que de fato hospedes procuram ou querem, pois bem, bem vindos ao mundo novo.

 

O tempo para cada individuo é visto de maneira diferente e temos diferentes maneiras de lidar com o tempo, hóspedes que são atléticos buscam estar mais próximos a ambientes que tenham contato com a natureza e outros hóspedes preferem a introspecção, outros então querem apenas um lugar tranquilo, por estes e outros motivos e pesquisas é que os hotéis no estrangeiro estão mudando suas características de conforto colocando a disposição de seus hóspedes tempo para eles mesmo com serviços diferenciados que abalariam até mesmo as estruturas dos mais liberais e versados no tema.

 

Estas estruturas estão sendo instaladas não somente para os hóspedes, mas também para a utilização da comunidade local, são espaços especiais reservados para o aprendizado de artes plásticas, confecção de refeições naturais, locais para o relaxamento como meditação, yoga e tai shi shuan, locais para prática esportiva com ambientes envolvendo arvores e plantas, enfim, um mundo novo de conforto com atenção na qualidade esperada pelos hóspedes sem que eles tenham que pagar a mais por isso lhes proporcionando tempo para si mesmo.

 

De fato, as novidades com relação a hospedagem não são nada novas, são práticas milenares que só agora a nossa civilização as retomou e aqui no Brasil ainda estamos discutindo se estamos atendendo bem ou mal nossos hóspedes buscando errar menos e zelando pelo atendimento.

 

Portanto caro leitor, busque conhecer mais o seu hóspede, seu comportamento e suas expectativas, é apenas com este conhecimento que você dará a qualidade esperada a seu hotel.


*Mário Cezar Nogales é Consultor especialista em hotelaria, já tem publicados dois livros e atuante no trade hoteleiros saiba mais em www.snhotelaria.com.br   ou mande um e-mail: mario.nogales@uol.com.br

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