Opinião

A história que pode se repetir – Artigo de Mario Cezar Nogales

*Mario Cezar Nogales

 

Durante minhas viagens e conversas com colegas hoteleiros, chegamos a um ponto que todo hoteleiro tem um frio na espinha; afinal de contas, quando é que a hotelaria e os serviços de um hotel começam a fracassar?
 

É muito óbvio que nenhum gerente geral e nenhum proprietário de hotel querem ver seu barco afundar, mas é indubitável que um dia essa hora chega, e então, como identificar que sua unidade está fazendo água não é uma questão muito simples.
 

Todos se lembram da crise hoteleira que ocorreu no início do século, na verdade a crise começou após vários anos de consecutivos e excelentes números apresentados pela hotelaria, grande ocupações, diária media altíssima, excelentes resultados no Lucro Operacional Bruto, excelentes salários e enfim, uma infinidade de atributos que nos fazem lembrar-se de hoje.
 

Mas a crise hoteleira do início do século teve o seu principio ligado a várias consequências e começou a dar sinais logo em 1998. Naquela época, na década de 90, após vários anos de grandes ocupações e receita, um novo formato de empreendimento começou a surgir e eram os chamados flats. O Flat que na verdade é um edifício diferenciado que tem uma administração voltada para a hotelaria, assim como vários serviços voltados para hotelaria como os: serviço de camareiras, recepcionistas, restaurante, e todas as demais comodidades de um hotel, porém com a preocupação única a moradores, e não a hóspedes.
 

Devido ao grande crescimento deste tipo de empreendimento, administradoras internacionais e nacionais viram um filão que não estava sendo atendido, e a partir daí surgiu o Pool de Locação. A ideia original do Flat que era para atender a um público no mínimo mensalista, passou a atender o público acostumado com dias nos hotéis.

 

Com um valor de diárias relativamente mais baixo que os hotéis, logicamente devido a um número menor de impostos que eram cobrados do Flat, que no fundo era um condomínio, onde cada apartamento tem o seu proprietário, ao se reunir em um Pool Administrativo (ou um grupo de proprietários que fundavam uma empresa hoteleira) com o fim de explorar seus quartos como hotel e dividir os lucros, se tornou uma grande ideia de investimento.
 

A partir daí, grandes incorporadoras começaram cada vez mais e mais construir flats com o único propósito de operação hoteleira, haviam até os edifícios que já se colocavam como 100% pool hoteleiro, bem, você pode imaginar quantas cabeças começaram a ficar carecas dentro da hotelaria, pois os flats estavam tirando hóspedes dos hotéis, com seus preços relativamente mais baixos, e com os serviços quase que equiparados.  O problema, afinal de contas, não era esse, mas sim a crescente continuidade de construção de empreendimentos deste tipo que, apesar de: em um primeiro momento atender aqueles hóspedes que não tinham onde se hospedar, pois a cidade já não comportava com a quantidade existente, num segundo momento começou a dividir a quantidade de hóspedes, pois esta, que já estava sendo atendida não cresceu mais, e mesmo assim, o número de meios de hospedagem continuava a crescer.
 

A ocupação média dos meios de hospedagem até 1998 era de 70% anual e começou, a partir daquele ano a decair por conta do crescimento descontrolado do número de flats, até 2001 a ocupação média já havia caído para 50% anual, com isso hotéis, administradoras e gestores obrigatoriamente tiveram que se tornar mais eficientes e buscar novos hóspedes e novos meios de atrair hospedes, cobrando da cidade mais eventos, e melhores condições, este número, ainda assim continuava a cair.
 

Daí aconteceu algo que, apesar de previsível era pouco provável, o 11 de setembro marcou o coração do mundo ocidental com o que se chamaria de “medo ao mundo árabe”, e ainda nos dias de hoje não se sabe ao certo o que de fato ocorreu naquele fatídico dia, quem são os verdadeiros responsáveis e tudo mais, mas bem, este não é o caso.
 

Com o fechamento dos aeroportos nos Estados Unidos e o medo implantado de um novo ataque, justamente com aviões de passageiros, foi à gota d’água para a hotelaria nacional; quem já estava em queda, caiu de vez, quem estava se segurando, tomou uma rasteira, quem estava bem, escorregou feio.
 

Vários Flats fecharam e vários hotéis também, os sobreviventes daquela época, foram somente e tão somente os verdadeiros hoteleiros que nunca se deixam abater por uma crise ou por excessos.
 

Estamos agora vivenciando os mesmos casos vividos na então década de 90, depois de uma recuperação vertiginosa na década passada, parece até que a hotelaria nacional não se lembra de sua própria historia recente. Hoje temos um “boom” hoteleiro, com grandes ocupações por todo o território nacional, inclusive em lugares que nunca antes se falava em hotelaria, hoje os hotéis de lá estão, como se diria: bombando.
 

Obviamente e logicamente o que se vê hoje é bem diferente do que se via nas décadas de 1970 e 1980, com a agilidade da internet, o crescimento econômico das classes sociais, a vinda de eventos internacionais as terras tupiniquins como a Copa e as Olimpíadas, deram uma nova força e um novo fôlego ao turismo e a hotelaria nacional.
 

Não há sequer um só lugar, cidade, estado,  que possa reclamar de seus números, a não ser aqueles que não conseguem ver os números ou são péssimos administradores, (daí não tem jeito mesmo, não há como salvar a pele).
 

O que está começando a se observar são os crescentes números de construções hoteleiras sejam eles de pool de investidores, sejam eles de investimentos provenientes do BNDES. Há um crescente numero de hotéis sendo inaugurados e um crescente número de hóspedes que precisam ser atendidos, no período da Copa e das Olimpíadas que serão a coqueluche do turismo nacional, com certeza vai faltar lugar para todo mundo, e como na década de 90, cada vez mais e mais investimentos serão realizados.
 

Não é querer colocar sal no mel de todos os investimentos, mas a grande questão é o numero real e verdadeiro de hospedes sejam eles internos ou externos, que somente ira continuar a crescer se houver investimento sério no índice de qualidade de vida do brasileiro.
Não acredita?
Observe alguns números:
50 mil mortos por ano por assassinatos
Número crescente da criminalidade, inclusive em lugares que nunca tiveram tal histórico,
Crise mundial que assombra a todos os países no hemisfério ocidental norte,
A saúde pública que nunca melhorou e nunca vai melhorar, com um número cada vez maior de mortes por ataque cardíaco (já chegamos a 190 mil por ano),
O crescente endividamento pessoal que hoje se estima que cada trabalhador brasileiro tenha uma dívida equivalente a um ano de salário,
Numero crescente de hotéis nos quatro cantos do País,
Uma crise crescente com prenúncio de guerra entre Estados Unidos e Irã (o improvável possível).
 

Será que isto não te lembra de nada?
Some a isto o seguinte:
A arrogância da hotelaria atual, onde o hóspede deixou de ser um hóspede e passou a ser um número, afinal de contas o que vale hoje é o resultado financeiro que se tem por conta das dívidas adquiridas do que a excelência nos serviços e na hospitalidade,
A falta de profissionais qualificados para os serviços básicos nos hotéis, como recepção, governança, manutenção,
A falta de interesse dos jovens para com a hotelaria, afinal de contas, pra que trabalhar em finais de semana se pode se ganhar o mesmo sem precisar estar na hotelaria,
A falta de planejamento e seriedade nas tomadas de decisões pela maioria da hotelaria nacional,
A corrupção interna que assolam grande parte das redes hoteleiras ditas profissionais.
 

Preparados então?
Agora, agreguem algumas informações como: redes internacionais trazendo novas bandeiras ao Brasil e o numero crescente de investidores não hoteleiros, entrando na hotelaria e “voila”, você vai ver aquele filme de novo só que o nome será: Crise na hotelaria parte II – a vingança.
 

O detalhe crucial é: ninguém está trazendo dinheiro novo ou novos recursos, estes recursos são do BNDES ou de Brasileiros. O Banco Nacional do Desenvolvimento até está oferecendo dinheiro no estrangeiro para investidores estrangeiros virem construir hotéis em terras tupiniquins sem colocar um centavo sequer, as Grandes Marcas, apenas estão trazendo a sua malinha de opções para o crescente número de hotéis, não estão trazendo dinheiro ou recursos, estão apenas vindo com novos rótulos para o que se chama hotelaria, quando na verdade a hotelaria é muito mais do que isto. Daí hoteleiros de verdade, que começam a sentir o medo das grandes marcas e redes, começam a se borrar e entregar seus empreendimentos a estas marcas e quando tudo vier por água abaixo, como diria na década de 1980: “beijinho-beijinho, tchau-tchau”.
 

Não digo que será hoje, ou será amanhã, mas com certeza acontecerá após as Olimpíadas, não sei se será logo a pós ou ainda perdurará alguns anos a mais, mas até as datas começam a coincidir, vejam, a crise se iniciou em 1998, e porque não estimar que haja uma crise em 2018? Como administrador hoteleiro e consultor o planejamento é uma prioridade, então devemos vislumbrar que uma crise está chegando, parece muito tempo, porém, anos passam num piscar de olhos e quando mal percebermos a Copa e as Olimpíadas já terão se tornado história, e estaremos preparados para enfrenta-la se nada for feito antes.

 

*Mario Cezar Nogales é Consultor especialista em hotelaria, já tem publicados dois livros e atuante no trade hoteleiros saiba mais em www.snhotelaria.com.br  ou mande um e-mail:  mario.nogales@uol.com.br

 

 

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