Especial

Comissão de Valores Mobiliários poderá regulamentar condo-hotéis

Muitos abusos foram cometidos por incorporadores e construtores com a promessa de retorno de até 1,8% mensal sobre o capital investido, o que fez com que a CVM olhasse mais atentamente este mercado para proteger os investidores

O principal modelo que sustenta os investimentos na expansão do parque hoteleiro brasileiro poderá ter regulamentação da CVM – Comissão de Valores Mobiliários para assegurar os direitos dos investidores, assim como já acontece com quem adquire ações na bolsa de valores. Este foi um dos temas mais polêmicos debatidos durante a 3ª edição do ADIT Juris – Seminário de Soluções Jurídicas voltadas aos setores imobiliário e Turístico, que aconteceu entre os dias 27 e 28 de março no Sheraton Bahia Hotel, em Salvador. O evento que é promovido pela ADIT Brasil – Associação para o Desenvolvimento Turístico e Imobiliário do Brasil, reuniu diversos especialistas do Direito e os players do mercado imobiliário do Brasil.

De acordo com Felipe Cavalcante, Presidente da ADIT Brasil, a CVM enviou um comunicado recentemente a vários construtores e incorporadores que estão desenvolvendo projetos de hotéis com dinheiro captado de investidores, alertando que poderá criar mecanismos de regulamentação por entender que estes investimentos geram insegurança jurídica. “Eu acredito que a CVM num primeiro momento quer entender como funciona este modelo e debater com os profissionais do setor e se não ficar contente, aí sim poderá regulamentar. A preocupação da CVM é com os investidores que foram lesados no passado ao adquirirem unidades habitacionais hoteleiras sob promessas de retorno do capital investido, mas que em alguns casos não ocorreu e hoje tem muitos investimentos acontecendo no Brasil e no meu ponto de vista, excessos de ofertas. Mesmo assim, acredito que seja desnecessário esta regulamentação dos condo-hotéis por parte da CVM, pois o próprio mercado se auto regula. Hoje existem muitos dados e pesquisas que apontam os riscos de super ofertas e alerta quem deseja especular neste mercado. Um bom exemplo é o Manual de Melhores Práticas, elaborado pelo Secovi de São Paulo, o Sindicato da Habitação”, revela Cavalcante.

Mesmo ele sendo um construtor e atuar no segmento hoteleiro, ele acredita que o atual modelo de condo-hotéis necessita ser repensado. “A venda tem de ser transparente, quem incorpora, constrói, vende e administra também tem de ter ciência que poderá ser responsabilizado pelo retorno prometido, pois o que não pode é o investidor ser lesado”.

O Consultor Caio Calfat concorda com Cavalcante que este manual deu uma grande contribuição ao mercado como um orientador para as boas práticas e que inclusive recebeu elogios da própria CVM ao saber de sua existência. Mesmo assim, alguns abusos foram cometidos e Calfat acredita que se a CVM entrar neste mercado de condo-hotéis para regulamentar, dificilmente sairá e desestimulará grande parte dos investimentos no setor hoteleiro.

Modelo norte-americano
Em sua opinião, se houvesse estímulos de financiamentos por parte de instituições privadas ou mesmo desburocratização pelos órgãos públicos na liberação dos recursos, o condo-hotel não seria a única forma encontrada de financiar o setor no Brasil. “Deveríamos adotar o modelo norte-americano de prestação de contas para que os bancos e instituições financeiras possam entender melhor a sistemática de um hotel e com isto facilite a liberação dos recursos. Quando um hotel apresenta a um banco os resultados baseados em roms night, revpar ou mesmo revenue management, o banco fica sem entender e acaba não liberando os recursos. Mas para implantar o modelo norte-americano é preciso um verdadeiro trabalho de `formiguinha`e isto levará anos, pois envolve modificar cultura e costumes”, assegura Calfat.

A advogada Márcia Rezeke, que foi uma das participantes deste painel na 3ª edição do ADIT Júris, acredita que pelo fato da CVM não conhecer como é feita a venda de uma unidade hoteleira, ela avalia que isto seja uma operação que envolve risco e que por isto deveria ter seu controle e fiscalização. “Na incorporação imobiliária do condo hotel, o uso não é feito por opção do proprietário, pois não é permitido que ele transforme este bem adquirido em uma residência. Existe uma confusão por parte da CVM quando ela fala que a aquisição de uma unidade hoteleira é um investimento de risco, mas isto é equivocado. Mesmo que o investidor não tenha a rentabilidade prometida, ainda permanece com a unidade que é tutelada pela legislação do código de defesa do consumidor”, assegurou Márcia.
Ela lembra que o mercado hoteleiro paulistano só cresceu e se modernizou graças ao modelo condo-hotéis, mas se houve ou ainda existem abusos, eles devem ser combatidos. “A lei de incorporação imobiliária deve ser utilizada, mas não é possível a CVM interferir numa atividade por ter um conceito amplo e com o pressuposto de que em tempos anteriores houve abusos”.
Para o advogado Carlos Eduardo Peres Ferrari, “A CVM não está preocupada com o que está sendo vendido, mas a forma como é vendido e se existe a oferta pública, o que por si só caracteriza o risco do negócio. Acredito que este comunicado que a CVM está enviando ao mercado sirva mais como um alerta de que existem limites, pois a CVM não pode regular a venda de um quarto de um hotel e se assim fizer, pode trazer uma grande insegurança jurídica e paralizará grande parte dos investimentos que acontecem na hotelaria brasileira”, teme o advogado Ferrari.

Muitos abusos no setor
Um advogado de um renomado escritório carioca que pediu para não ser identificado, compactua com a preocupação da CVM. Ele enxerga o modelo de condo-hotéis como um produto que deve ser comercializado no mercado de capitais e não por corretores de imóveis que vendem sem qualquer responsabilidade de retorno”, avaliou. Ele mencionou um caso que aconteceu com um cliente seu que o procurou para lançar um produto hoteleiro na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, mas em razão de uma análise mercadológica, seu cliente orientado a não lançar o empreendimento. “A cidade do Rio de Janeiro contará com 15 mil novos apartamentos até as Olimpíadas de 2016 e destes, 11 mil serão na Barra da Tijuca.Vários empreendimentos já entraram em operação e a queda na taxa de ocupação é um sinal de que algo estranho está acontecendo. Somente no último carnaval, a Barra da Tijuca teve uma queda de 15% em relação ao ano passado, conforme dados oficiais das próprias entidades representativas do setor. E este nosso cliente que insistiu em lançar este produto hoteleiro, foi um dos que receberam o comunicado da CVM no mês passado e agora se manifesta preocupado”, concluiu o advogado.
Se na cidade do Rio de Janeiro houve a especulação em somente um único bairro, o que motivou a preocupação da CVM, o que dizer de Belo Horizonte onde a cidade foi alvo de uma mega especulação. Depois que a Prefeitura local resolveu conceder incentivos para a construção de novos hotéis na cidade, 73 projetos deram entrada, mas 30 nem saíram do papel por falta de investidores ou por serem meras especulações. Dos 43 projetos que saíram das pranchetas, alguns estão com obras paralisadas e dificilmente vão ser concluídos e como fica os investidores nesta história? Quem responde é um renomado advogado em Belo Horizonte que também pediu para não ser identificado. “Várias construtoras e incorporadoras sem expertise e conhecimento da realidade do mercado na capital mineira, resolveram apostar no lucro fácil ao lançar unidades hoteleiras. Em alguns casos prometeram retorno de até 1,8% mensal sobre o capital investido, o que é no mínimo algo completamente descabido, mas está mencionado em folder e catálogos impressos e distribuídos aos investidores. Se a taxa de ocupação da hotelaria de Belo Horizonte está caindo de forma vertiginosa, conforme dados das entidades representativas do setor, como é que estes investidores terão este retorno prometido? Por isto acho bastante salutar a intervenção da CVM para regulamentar este modelo de venda de unidades hoteleiras que estão sendo feitas pelo Brasil afora e muitos especuladores imobiliários certamente terão noites mal dormidas”, assegurou o advogado.

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