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Hotelaria brasileira terá que ser criativa para crescer em 2023

Mesmo enfrentando os impactos da variante Delta da COVID-19 no primeiro trimestre de 2022, o setor hoteleiro conseguiu se recuperar e teve uma boa performance ano passado com taxas de ocupação similares a 2019. Na perspectiva macroeconômica, a demanda hoteleira reage a taxa de crescimento da economia, ao custo do transporte & ao câmbio. Mas o baixo número de aberturas de novos hotéis em 2023 adicionados as operações fechadas durante a pandemia representam um fator favorável a taxa de ocupação.

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Essa é a opinião do Consultor Roland de Bonadona nessa entrevista exclusiva em que ele aborda outros temas interessantes e atuais do setor como: O impacto que pode proporcionar a hotelaria tradicional o crescimento do aluguel de curto prazo, alta da taxa Selic e dos combustíveis de avião, escassez da mão de obra e os gargalos existentes no setor hoteleiro. Confira a seguir. 

Revista Hotéis – Que análise você faz do desempenho do setor hoteleiro no Brasil em 2022? A pandemia da COVID-19 ainda influenciou? Ou houve crescimento da taxa de ocupação e diária média?

Roland de Bonadona – Em 2022, o setor hoteleiro conseguiu globalmente um desempenho similar ao ano de 2019, com taxas de ocupação na faixa dos 60% e diárias compensando a inflação do período. Falamos do desempenho médio do setor, consolidando situações diferentes entre as praças e os segmentos de atuação. De forma resumida, as regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste ficaram acima da média, Sul e Sudeste um pouco abaixo. Os Resorts conseguiram o melhor progresso, enquanto os hotéis urbanos especialmente quando trabalham com mercado internacional e grandes eventos demoraram mais a reconectar, atrasando no primeiro trimestre e acelerando a recuperação no final do ano.

A pandemia prejudicou o primeiro trimestre em função da variante Delta, porém pudemos observar uma reação do mercado, tanto de lazer como de eventos a medida da diminuição das restrições sanitárias. O INFOHB do mês de dezembro, publicado pela área de estatísticas do FOHB, apresenta informações que considero muito confiáveis, distribuídas por região, por praça e por categoria. Oferece uma análise bem segmentada do ano 2022 e confirma a recuperação global. 

R.H – Houve recuperação de fluxo de caixa nos hotéis? Quais fatores determinam a retomada da receita?

R.B – A geração de caixa dos hotéis tem como principal indutor a receita de hospedagem que evoluiu bem em 2022. O lado das despesas foi beneficiado pela defasagem na recontratação das equipes reduzidas durante a pandemia. O final do ano foi beneficiado também pela entrada em vigor do PERSE – Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos, isenção de impostos federais. Este dispositivo permitirá ao setor recompor as reservas indispensáveis a reposição de ativos, investimentos em tecnologia, e repaginação dos ambientes que foram praticamente abandonados estes três últimos anos por causa da pandemia. 

R.H – Que análise você faz dos hóspedes pós pandemia? Realmente eles estão mais exigentes? E como os meios de hospedagens devem se adequar?

R.B – Os hospedes estão com a percepção clara do aumento dos preços e em contrapartida, ficam ainda mais frustrados com eventuais falhas devidas à defasagem na recomposição do quadro, sem mencionar o atraso nos investimentos. Só pode repercutir na queda das avaliações. Os melhores operadores que monitoram de perto a situação já estão com iniciativas e planos de ação implantados para recuperar os bons indicadores de antes. 

R.H – Qual sua expectativa para a performance da hotelaria no Brasil em 2023? Alta da taxa Selic, aumentos constantes de preços das passagens aéreas ou ajustes na política econômica podem impactar o setor nesse ano?

R.B – Na perspectiva macroeconômica, a demanda hoteleira reage a taxa de crescimento da economia, ao custo do transporte & ao câmbio. As previsões para o crescimento e o custo do transporte são pessimistas e podem segurar o crescimento da demanda. O Real fraco deve em compensação proteger, pelo menos em parte a demanda de lazer a favor da hotelaria brasileira. Destaco o grande trabalho realizado junto ao poder público pela ABEAR do Eduardo Sanowicz para conseguir medidas permitindo compensar os fortes aumentos de custo do aéreo, principal causa do aumento do preço das passagens. Taxa de ocupação depende também da tensão entre oferta e demanda. Do lado da oferta, o baixo número de aberturas da novos hotéis adicionados as operações fechadas durante a pandemia representam um outro fator favorável a taxa de ocupação.

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R.H – Alguns estudos apontam a diminuição cada vez mais das viagens corporativas, assim como de eventos presenciais e o híbrido ganhará cada vez mais força. Uma vez se concretizando essa realidade, que impacto isso poderá ter na performance do segmento hoteleiro nos próximos anos?

R.B – Podemos observar de um lado uma maior flexibilidade na segmentação entre o tempo passado na residência, no escritório, e em viagem. A regra geral anterior era cinco dias no escritório, dois em casa ou segunda residência nos finais de semana, e um mês de férias dividido em um ou dois períodos anuais. Esta segmentação rígida resultava da ancoragem do trabalho ao escritório. Com a digitalização crescente das tarefas e das informações, a divisão dos tempos tornou-se bem mais flexível. Outro exemplo, fazíamos facilmente antes viagens curtas para reuniões ou entrevistas que passamos a encaixar muito mais convenientemente nas nossas agendas no modo virtual. A tecnologia induziu estas tendências desde os anos 2010’s e a pandemia acelerou o movimento.

Em consequência, as estadias tornaram-se cada vez mais hibridas, viraram “blended stays”, o que considero um grande passo a favor da melhor distribuição da demanda hoteleira entre os vários dias da semana e os vários meses do ano. Os últimos meses do ano 2022 evidenciaram também uma forte retomada da demanda para eventos, sem que possamos atribuir pesos precisos ao que resulta de reprogramações e ao que corresponde simplesmente a volta ao calendário anterior. Finalmente, acredito que estamos ainda na fase de transição pós-pandemia, dentro de uma transformação mais profunda dos comportamentos e da sociedade. Vamos ainda assistir a oscilações pendulares dentro das grandes mudanças de comportamentos em andamento. O importante é mostrar agilidade e reatividade para ajustarmos as novas necessidades dos clientes e não perder oportunidades de sair a frente dos concorrentes. 

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R.H – O short-term-rental (aluguel de curto prazo) está ganhando cada vez mais força no segmento hoteleiro no Brasil e muitas redes já aderiram. Esse modelo de negócio não poderia contrapor aos interesses da hotelaria convencional?

R.B – O crescimento do Short Term Rental e do Staycation é mais uma manifestação da convergência dos segmentos. Neste caso, acontece na ponta da oferta em resposta as mudanças na demanda. A tendência veio para ficar. O diferencial do Short Term Rental em termos de maior espaço disponível, maior independência e menor preço, faz desta opção uma boa alternativa ao quarto de hotel tradicional, especialmente para famílias e estadias mais longas. Representa um claro estímulo ao crescimento das viagens. Plataformas com Airbnb ou Expedia agilizam a distribuição, e Property Management Companies dedicadas como Vacasa ou Sonder no exterior, Staycharlie ou Tabas no Brasil, conseguem viabilizar a operação deste meio de hospedagem bem diferente do hotel. Resta a harmonizar as regulamentações e condições de exploração entre os diferentes segmentos que atendem os mesmos turistas.

Existe um interesse natural das operadoras hoteleiras convencionais em explorar a gestão dos ativos de Short Term Rental. Ainda precisam aprender a gerenciá-los, a distribuí-los, e a rentabilizar as operações. Ainda não me convenci com as primeiras experiências, mas estamos apenas no início de um longo caminho. 

“Existe um interesse natural das operadoras hoteleiras convencionais em explorar a gestão dos ativos de Short Term rental” 

R.HAlguns especialistas do setor dizem que o modelo condo hotel já é ultrapassado para alavancar investimentos da hotelaria. Qual sua opinião a respeito? Existem outros modelos de investimentos para o setor ou acredita que o novo Governo poderá disponibilizar linhas públicas de crédito?

R.B – O parque hoteleiro é um componente de infraestrutura indispensável ao desenvolvimento do turismo. Fora do Brasil, a expansão dos hotéis modernos foi financiada por um mix de capital e de financiamentos bancários podendo atingir até 60 ou 80% do valor total, com prazos, juros & garantias adequadas ao perfil do setor, e muitas vezes incentivados pelo poder público. A grande virtude do modelo tipicamente brasileiro de Apart-hotéis e do Condotels, foi de viabilizar durante 20 anos a infraestrutura hoteleira de um país onde não existiam as opções viáveis de financiamento utilizadas no resto do mundo. O modelo permitiu a captação direta do financiamento junto a investidores pulverizados. Aconteceu o mesmo com os consórcios, tipicamente brasileiros para viabilizar a compra parcelada de carros e outros equipamentos.

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Sem a criatividade dos setores imobiliário e hoteleiro, o setor de viagens, turismo & eventos, inclusive o aéreo e todos os setores dependendo da economia do visitante, seriam muito menos desenvolvidos no Brasil por simples falta de opções de hospedagem para os viajantes. Não significa que o Condotel seja o melhor modelo. O modelo equity + financiamento ou o fundo imobiliário permitem viabilizar um projeto hoteleiro com gastos bem menores de estruturação & captação de recursos, e uma administração muito mais racional do hotel do que a operação condominial.

 R.H – Com sua ampla experiência no setor hoteleiro, quais os gargalos existentes no setor?

R.B – O custo Brasil, e seus desafios, não são específicos do setor hoteleiro, mas alguns dos seus componentes tem impacto especialmente relevante: A burocracia e a fiscalidade, a legislação trabalhista rígida e recordista em passivos que tornam cara e insegura a operação da atividade com participação intensa da mão de obra, o custo e a dificuldade de acesso ao crédito já mencionados. Além disso, temos hoje dificuldades particulares em termos de contratação de profissionais interessados pelos métiers da hospitalidade e engajamento do staff. Por fim a complexidade e o custo da tecnologia necessária a operação do sistema de distribuição desafiam a maioria dos hoteleiros independentes e pequenos operadores, favorecendo as grandes plataformas de Booking e os grandes operadores. 

“O custo Brasil, e seus desafios, não são específicos do setor hoteleiro” 

R.H – Muitos colaboradores hoteleiros que perderam seus empregos durante a pandemia migraram para outros segmentos, com jornada de trabalho menor e salários mais atraentes. Falta de mão de obra é algo que preocupa? Como o setor deve lidar com isso? Investimentos em tecnologia poderia ser uma solução?

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R.B – Tecnologia ajuda especialmente na fase pré-estadia e na facilitação do acesso e do check-in. Mas na fase da estadia, os profissionais continuam diferenciais. Nossas melhores e piores experiências em estadias, são muito frequentemente ligadas as interações, encantadoras ou frustrantes com as equipes, ou com os resultantes da qualidade do seu trabalho.

Não é fácil a tarefa dos profissionais hoteleiros. Eles entregam a proposta da marca, e por isso devem entender, interpretá-la e vestir a camisa desta marca. Devem oferecer disponibilidade 24/24 horas e 365/365 dias, mostrar paciência e simpatia para cada viajante individual ou em grupo, muitas vezes além do final do expediente. E agora também devem dominar as ferramentas digitais e a complexidade da tecnologia. A contratação de funcionários, sua capacitação, sua motivação e seu engajamento tornaram-se grandes desafios do setor após a pandemia.

Os métiers da hospitalidade são extremamente gratificantes. Receber, conhecer e atender bem os hóspedes, saber se comunicar e tomar iniciativas, trabalhar em equipe, são fatores chaves de sucesso profissional e permitem construir uma bela carreira mesmo sem ter passado por faculdades hiper seletivas. O setor precisa também valorizar melhor seus profissionais e exaltar a nobreza da vocação para hospitalidade, além das modalidades básicas do contrato de trabalho.

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R.H – A transformação tecnológica e digital representa um enorme desafio para os hoteleiros. Como os pequenos podem se adaptar?

R.B – Para serem competitivos, os pequenos meios de hospedagem necessitam se adaptar a muitas mudanças e poderíamos aproveitar de muitas oportunidades, mas parece muito caro e complexo! Os menores operadores não têm escala suficiente para se equipar em recursos tecnológicos nem conseguem contratar profissionais qualificados para acompanhar, se adaptar e aproveitar as múltiplas mudanças.

Iniciativas como o lançamento do Turistech, sob o impulso de Ana Biselli e Marcelo Picka da Resorts Brasil, é uma incrível contribuição ao setor. Permitirá que hoteleiros aprendam a trabalhar com o formato de Open Innovation, acessível e flexível, com tudo que a tecnologia pode oferecer para melhorar a venda, a experiência dos clientes, a qualidade do trabalho e a produtividade. Encontrarão soluções, parceiros, e poderão fazer os seus próprios pedidos às startups e empresas de tecnologia que participam da iniciativa sob a coordenação do experiente Eduardo Lorea. Considero uma das novidades mais promissoras para nosso setor, vale a pena acompanhar de perto e participar!

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Edgar J. Oliveira

Diretor editorial - Possui 31 anos de formação em jornalismo e já trabalhou em grandes empresas nacionais em diferentes setores da comunicação como: rádio, assessoria de imprensa, agência de publicidade e já foi Editor chefe de várias mídias como: jornal de bairro, revista voltada a construção, a telecomunicações, concessões rodoviárias, logística e atualmente na hotelaria.

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