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Entidades do setor criticam volta do visto de turismo no Brasil

Uma vez em vigor, com essa medida os norte-americanos, canadenses, japoneses e australianos terão que solicitar visto de entrada no Brasil e isso pode impactar de forma significativa a redução do fluxo de visitas desses estrangeiros

No dia 8 de março o governo brasileiro decidiu voltar a exigir vistos para turistas vindos dos Estados Unidos, Austrália, Canadá e do Japão. Essa medida prevalecia desde 2019, quando o Governo de Jair Bolsonaro suspendeu a exigência de vistos desses quatro países. Mas essa medida desconsiderou o princípio da reciprocidade, geralmente adotado pela diplomacia com a alegação de que isso facilitaria a entrada de mais turistas. Mas os números levantados pelo próprio governo federal em 2019 mostraram que essa medida não trouxe aumento significativo. O aumento registrado de turistas norte-americanos entre 2018 e 2019 foi de 12%, mas após dois anos de pandemia e no ano de 2022, os números registrados são um pouco inferiores a 2018.  Já o número de japoneses caiu em 2019 em 4,5%, e em 2022 foram apenas 17 mil pessoas. Entre os australianos houve um crescimento de cerca de 15%, e entre os canadenses, de 25% entre 2018 e 2019. No entanto, esses dois países representam juntos menos de 1% dos turistas que vêm ao Brasil. Estados Unidos e os demais países envolvidos, cobram visto dos brasileiros. Para rever, basta revogar o decreto presidencial que previa a dispensa do visto para os EUA, Japão, Canadá e Austrália, mas a data para implementação ainda não foi divulgada.

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Essa decisão de voltar a exigir vistos para turistas foi recebida negativamente por várias entidades, como a FBHA – Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação. A alegação é que uma vez que a medida tem como justificativa um princípio jurídico, de Direito Internacional, que norteia as relações diplomáticas entre Estados Soberanos, a reciprocidade, é inexistente entre tais países e o Brasil, quanto à dispensa de vistos para turismo. Para Alexandre Sampaio, Presidente da FBHA, essa revogação prejudicará a relação com esses países, uma vez que, diante da burocracia, não será mais atrativo para estrangeiros visitarem o país, desestimulando o turismo internacional em solo brasileiro. “Um exemplo: a Itália não exige visto de brasileiros. Assim, com base num tratado entre Itália e Brasil, o Brasil também não exige visto de italianos. É uma relação de troca e de respeito, mas que não precisa, necessariamente, ser observada com os EUA, Japão, Austrália e Canadá, pois a exigência de visto para turistas desses países, somente trará prejuízo para o Brasil. A volta desta exigência vai impactar no lazer e, em parte, na economia”, comenta Sampaio.

Alexandre Sampaio: “Uma decisão desse porte precisa ser tomada com cautela e avaliada junto a todos os representantes do turismo brasileiro” (Foto – Marcelo Freire)
Mobilizar forças

Ele defende a ideia do trade turístico se unir e mobilizar forças para que essa medida não seja revogada. “Uma decisão desse porte precisa ser tomada com cautela e avaliada junto a todos os representantes do turismo brasileiro. Não podemos permitir mais gargalos para o pleno funcionamento do setor”, finaliza o presidente Sampaio.

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O seu colega Antônio Florêncio de Queiroz Junior, Presidente da FECOMÉRCIO Rio de janeiro, enxerga nessa medida um retrocesso. “Revogar uma medida que sequer foi efetivamente experimentada constitui-se num contrassenso. A exigência do visto para estrangeiros é na prática um retrocesso que vai prejudicar nossa economia. Além de dois anos em profundo refluxo do turismo em nível mundial, o Brasil não investiu na divulgação deste benefício aos cidadãos e operadores de viagens destes respectivos países. O Brasil também não empreendeu investimentos na promoção de nossos atrativos turísticos nos principais mercados emissores de turistas no mundo. Essa decisão impacta o setor de turismo nacional exatamente no momento em que o trade turístico retoma as atividades no receptivo internacional. E, certamente, vai atrapalhar a expansão do fluxo aéreo destes mercados para o Brasil”, adverte o presidente da FECOMÉRCIO RJ.

Ele lembra que os quatro países afetados pela medida respondiam, até a pandemia, por mais de 800 mil turistas entrando no Brasil anualmente. “Para o Rio de Janeiro, um dos grandes destinos turísticos do mundo, a medida traz um prejuízo em especial: cerca de 34% dos turistas estrangeiros visitam a nossa capital, sendo que boa parte desse fluxo se estende também às principais cidades turísticas do estado, como Paraty, Búzios e Petrópolis. Entre o simbolismo de uma suposta soberania nacional ou o entendimento das questões de um setor produtivo que representa cerca de 10% dos empregos gerados em nosso País. O Itamaraty infelizmente optou pelo caminho de uma decisão equivocada, distante da economia real do Brasil, e que terá como efeito prático prejudicar a população brasileira e os estados cuja economia está diretamente atrelada ao turismo. Reivindicamos, portanto, que o Itamaraty reveja essa proposta que, a rigor, atrapalha o desenvolvimento do turismo brasileiro”, concluiu Queiroz Junior.

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Recentemente José Roberto Tadros, Presidente da CNC – Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (da qual a FECOMÉRCIO faz parte), esteve em Brasília (DF) e juntamente com as principais entidades empresariais do turismo entregaram um manifesto à Ministra do Turismo, Daniela Carneiro. O objetivo era para manter a flexibilização de vistos. “Esse é um pleito de grande interesse público e de relevância econômica para o Brasil. Pedimos que a questão seja reavaliada, pois a supressão da norma pode desestimular a vinda de turistas internacionais”, disse Tadros.  A ministra Daniela Carneiro informou que já está em contato com o Ministério das Relações Exteriores discutindo a demanda do setor e que recebeu o apoio do presidente da EMBRATUR, Marcelo Freixo, que também acompanha o tema.

Captação MICE prejudicada

E quem também está contra essa medida é Ibrahim Georges Tahtouh, Diretor da IT Mice e da Academia Brasileira de Eventos e Turismo. Segundo ele, o trabalho de captação MICE, fica muito prejudicado com mais esse retrocesso. “Campanhas de Incentivo nascem no mínimo um ano antes e dificilmente se escolherá o Brasil como destino. Não se sabe quem serão os vencedores e com que tempo a má vontade dos corpos consulares emitirão os vistos. É muito risco e os decisores escolherão outro destino onde tenham entrada livre.  O mesmo para Expositores de Feiras que venham de fora, assim como Hosted Buyers, com o risco de terem recusado o visto”, revela Tahtouh.

Ibrahim Georges Tahtouh: “O turismo médico e de incentivo será muito impactado com a revogação dessa medida” (Foto – Divulgação)
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Ele alerta que a volta da exigência de vistos de Entrada no Brasil, prejudicará um segmento que está se estruturando e investindo que é o Turismo Médico e Wellness. “Para quem tem cuidados de saúde e que trabalhamos para convencer a fazer o tratamento no Brasil, agora criamos um forte impedimento que é fazer a família correr atrás do visto de entrada. A disputa mundial pelo Turismo Médico é muito forte, um paciente e acompanhantes deixam em média o faturamento equivalente a 20/25 turistas de lazer. Como no Incentivo deixam o valor que se conseguiria com 12/15 Turistas de Sol e mar. Mais uma exportação de serviços que deixaremos de realizar, tendo Hospitais de referência internacional como o Einstein, Sirio Libanês, Copa D’Or etc e as melhores Clínicas de Estética, Neurologia, Odontologia, Oncologia e outras especialidades com profissionais reconhecidos em todo o mundo. Uma profunda dor a mais para sentirmos com a sensação de impotência diante de desmandos”, concluiu Tahtouh, lamentando que: “Agora que formamos um time altamente profissional na Embratur e prontos para atrair o turismo forte em divisas e impostos, real exportação de serviços, cortamos as nossas pernas e deixamos a concorrência internacional nadar de braçada”.

Um passo atrás

O Presidente nacional da ABIH Nacional – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, Manoel Cardoso Linhares é enfático em afirmar que: “O Brasil voltar a exigir vistos para cidadãos desses países será um passo atrás. A liberação da documentação para os países que mais viajam pelo mundo, em 2019, foi a consolidação de um pleito de décadas do setor de turismo. Não é razoável balizar essa decisão analisando somente os dados de entrada desses turistas nos anos de 2020, 2021 e 2022, uma vez que o mundo estava em plena pandemia, com voos paralisados, e pautado pelas restrições impostas pelo momento”, destacou Linhares.

Manoel Cardoso Linhares: “Não é razoável balizar essa decisão analisando somente os dados de entrada desses turistas nos anos de 2020, 2021 e 2022” (Foto – Divulgação)

Segundo ele, o setor de turismo precisa que a EMBRATUR faça um trabalho de divulgação mais intenso do Brasil junto a esses países, a fim de que os possíveis turistas locais tomem conhecimento dessa isenção. “Estamos estacionados há anos numa média anual de cinco milhões de turistas estrangeiros visitando nosso país por ano. Medidas como essa só atrapalham a expansão do turismo internacional no país. Precisamos de uma política nacional para o setor. Só assim aumentaremos o fluxo de visitantes estrangeiros no país e, finalmente, poderemos nos tornar um dos grandes destinos turísticos do mundo”, completou Linhares.

O Presidente do Sindicato dos Meios de Hospedagem do Município do Rio de Janeiro e conselheiro da ABIH-RJ, Alfredo Lopes, também manifesta descontentamento com o fato. “Durante mais de três décadas, o trade turístico brasileiro buscou a flexibilização do visto para o norte-americano, além de outros destinos emissores, em razão da relevância dos Estados Unidos como emissor de turistas e fonte de receita para o país. Por muito tempo, porém, a falta de infraestrutura da representação brasileira nos Estados Unidos, os altos valores cobrados pelo visto e até mesmo as denúncias de desvios jogaram contra nossos objetivos. A conquista do fim da exigência de visto, em 2019, apresentou resposta rápida. Dados da Polícia Federal mostram que houve incremento de 21,39% na entrada de turistas provenientes dos Estados Unidos no segundo semestre de 2019, em relação ao mesmo período 2018, embora em 2020 o cenário internacional tenha sido drasticamente afetado pela pandemia. Ainda na retomada, segundo o Ministério do Turismo, em 2021, o País chegou ao posto de principal emissor de turistas para o Brasil (132,2 mil) – historicamente, ocupava o segundo lugar, atrás da Argentina. Por isso, considero o retorno da exigência do visto uma visão unilateral desalinhada com a atual demanda do turismo nacional e fluminense. Esperamos que a nova gestão federal busque caminhos para ampliar investimentos em promoção e captação, que neutralize um histórico desastroso de relacionamento com estes mercados com enorme potencial de resposta. Mais do que nunca, voltar atrás na questão dos vistos é um retrocesso”, afirmou Lopes.

Alfredo Lopes: “A conquista do fim da exigência de visto, em 2019, apresentou resposta rápida” (Foto – Divulgação)
Promoção dos destinos será afetada

Toni Sando, Presidente da União Nacional de CVBs e Entidades de Destinos (UNEDESTINOS), explica que a medida de 2019 tornou os destinos brasileiros mais competitivos na captação de eventos internacionais. “Convention & Visitors Bureaus trabalham na promoção e apresentação de destinos para atração de congressos, feiras, convenções e simpósios para uma cidade, apresentando seus atributos e diferenciais, em um esforço de convencimento. A indústria de eventos mobiliza toda uma cadeia produtiva, gerando novas oportunidades, negócios, emprego e renda, injetando a economia com dinheiro novo. A isenção de visto para países estratégicos é um atributo a mais para o destino, uma vez que irá receber palestrantes, profissionais, expositores, imprensa e milhares de potenciais participantes. Em uma candidatura na qual os concorrentes não possuem necessidade de visto, tal fator pode ser crucial na definição do destino”, completa.

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Um estudo do professor da USP, Glauber Santos, mostra que nos oito meses em que a isenção de vistos teve condições de mostrar resultados antes do choque da COVID-19, os quatro países isentados enviaram ao Brasil quase 80 mil turistas a mais do que o previsto. Ele partiu de uma análise econométrica que comparou o número de chegadas de turistas internacionais no Brasil registrado pelo Ministério do Turismo, com o número previsto de turistas caso a isenção de vistos não tivesse sido implementada. “Considerando-se o perfil de gastos dos turistas desses países no Brasil, estima-se que a receita adicional tenha sido de R$ 328 milhões. Além disso, os dados mostram que o efeito da isenção de vistos ainda estava se consolidando quando foi abruptamente interrompido pela pandemia. A diferença entre o número real e o previsto estava crescendo a cada mês. Isso é esperado, pois o efeito da isenção de vistos não é imediato já que o mercado consumidor leva algum tempo para se ajustar às novas regras. Se a tendência crescente tivesse se mantido, estima-se que o resultado da medida poderia ter passado de 200 mil turistas e R$ 800 milhões por ano”, complementa o Professor.

Toni Sando: “O momento atual é de clara retomada e o Brasil precisa estar competitivo para que esses novos encontros possam incrementar a economia nacional” (Foto – AndreStefano.com)
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O professor ainda detalha que a isenção de vistos tem sido repetidamente evidenciada pela pesquisa científica como uma política com efeito positivo sobre a atração de turistas. “Por exemplo, um estudo de pesquisadores da Universidade de Michigan, que analisou os fluxos turísticos internacionais de 124 países ao longo de 14 anos, constatou que o efeito da dispensa de vistos é positivo”. Segundo a pesquisa, fluxos turísticos isentos de vistos são até 120% maiores do que aqueles em que o documento é exigido. “Além disso, os pesquisadores mostraram que o efeito da isenção sobre o turismo cresceu significativamente ao longo dos anos”, aponta Santos. Outro estudo, desenvolvido por pesquisadores de universidades taiwanesas acerca dos países da OCDE, também demonstrou que o impacto da desobrigação dos vistos é positivo. “Contudo, esse trabalho sugere que as oportunidades de ganhos têm diminuído nos últimos anos à medida em que o número de países com isenção tem aumentado. Parece estar havendo uma corrida por isenções e turistas em que o Brasil acaba de tomar a contramão”, sugere.

O crescimento apontado pela análise foi intensamente afetado pela crise da Pandemia da COVID-19, decretada em março de 2020, que praticamente paralisou toda a atividade do setor de turismo, eventos e viagens. “Durante praticamente dois anos, todas as decisões de captação de eventos foram interrompidas. O momento atual é de clara retomada e o Brasil precisa estar competitivo para que esses novos encontros possam incrementar a economia nacional. A medida anunciada nas últimas semanas se torna um contra-argumento. Não houve tempo hábil, por conta da pandemia, para se concluir de forma definitiva de que a isenção de vistos não é positiva de forma plena para o turismo no Brasil”, concluiu Sando.

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Edgar J. Oliveira

Diretor editorial - Possui 31 anos de formação em jornalismo e já trabalhou em grandes empresas nacionais em diferentes setores da comunicação como: rádio, assessoria de imprensa, agência de publicidade e já foi Editor chefe de várias mídias como: jornal de bairro, revista voltada a construção, a telecomunicações, concessões rodoviárias, logística e atualmente na hotelaria.

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