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A hotelaria e as questões relativas aos direitos autorais cobrados pelo ECAD

Artigo de Huilder Magno de Souza*

São inúmeras as decisões judiciais oriundas dos mais diversos tribunais estaduais que firmam o entendimento de que não são devidos direitos autorais sobre a execução de obras musicais no interior de quartos de hotéis e motéis. Serei objetivo e usarei uma linguagem clara sem o apego às expressões comumente utilizadas no universo jurídico.

A discussão se dá exclusivamente sobre a execução das obras musicais nos interiores dos quartos ou a mera disponibilização de aparelhos de televisão e rádio, portanto, não trataremos das áreas comuns ou de frequência coletiva (hall, piscina, recepção, etc), já que em tais ambientes entendemos que são devidos os direitos autorais.

A lei geral do turismo, que foi sancionada 10 anos após a lei de direitos autorais, conceituou os quartos de hotéis como de natureza privada, sendo um ambiente de frequência individual e de uso exclusivo do hóspede, portanto, especificou claramente que esses ambientes não se inserem no conceito de frequência coletiva tal qual previsto na lei de direitos autorais.

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Na mesma direção, e para aclarar qualquer dúvida, caminha o projeto de Lei 7413/17, do poder executivo federal, que altera a política nacional de turismo estabelecida então pela lei nº 11.771/08.

Balança da justiça – Crédito da foto – GettyImages

Enquanto não aprovado o projeto pelo parlamento, a luta é travada na seara jurídica, afinal são devidos ou não os direitos autorais sobre a execução de obras musicais em quartos de hotéis? E a mera disponibilidade dos aparelhos nesses ambientes, já seria capaz de atrair a aplicação da lei de direitos autorais?

Brasil afora há diversas decisões que não dão guarida às associações de autores para fazerem a referida cobrança. Exemplo disso, podemos citar o Tribunal de Justiça de São Paulo, que recentemente e através da 5ª Câmara de Direito Privado, negou provimento a um recurso do ECAD e entendeu que não são devidos os direitos autorais sobre execução de obras musicais em quartos de hotéis e motéis.

Para o TJSP — Tribunal de Justiça de São Paulo, o quarto é um ambiente privado e não pode ser equiparado a um local público ou de frequência coletiva, sendo inclusive comparado à casa do hóspede, conceito esse abrangido pela carta política de 1988.

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Decisões desse quilate e na mesma linha argumentativa brotam de diversos tribunais estaduais, a maioria deles tem posição favorável à tese hoteleira e contrária ao ECAD.

Entretanto, o ECAD reiteradamente recorre ao STJ — Superior Tribunal de Justiça,  e tem sido provido a maioria de seus recursos que buscam a reforma das decisões de segunda instância.

Apenas à título de exemplo,  podemos citar o Resp 1.719.477 – SP, Agravo Interno no Agravo em Resp 802.891 – RJ,  e Agravo em Recurso Especial 1.129.443 – PR, todos eles dão azo à tese do ECAD, entendendo que são devidos os direitos autorais pela mera disponibilidade dos aparelhos nos quartos, ora também porque a origem é distinta dos valores pagos pelas empresas de TV por assinatura, e portanto, não haveria um duplo recolhimento dos valores, como já defendido por alguns estabelecimentos hoteleiros.

Portanto, entendemos que se deve buscar uma mudança de entendimento nas instâncias superiores, para que sejam mantidos os acórdãos estaduais que consideram os quartos de hotéis como um local de ambiente de frequência individual e de uso exclusivo do hóspede, portanto, equiparado à sua residência, previsão essa de cunho constitucional.

A exposição desses e outros argumentos deve começar na primeira instância, e o tema deve ser exaustivamente explorado nos tribunais superiores, inclusive com sustentação oral, entrega de memorial e despacho pessoal com os relatores, de forma a marcar posição sobre esse tema tão relevante.

A jurisprudência não é imutável e os tribunais devem se mover de acordo com a mudança da sociedade, pois hoje quem se hospedaria num hotel e iria ouvir música em um rádio no interior de seu quarto se os smartphones trazem as mais diversas opções de aplicativos musicais sem qualquer embaraço e em nossas mãos?

Há inúmeros motivos que nos fazem ter esperança de que esse entendimento poderá ser revisto pelo STJ, pois a lei de direitos autorais foi sancionada numa época em que os aplicativos de música sequer existiam, quiçá os smartphones, o quarto de hotel era considerado um ambiente de frequência coletiva e, portanto, atraia a incidência desses direitos. Hoje não mais.

Lado outro, a luta continua no cenário político, vez que a ABIH tem se empenhado no congresso nacional em busca de uma legislação atualizada que contemple as mudanças ocorridas na sociedade brasileira nos últimos anos, dentre elas o já conhecido hábito de ouvir música nos nossos celulares, além da conceituação do quarto de hotel, situações que são mais que suficientes para uma mudança de rumo na atual jurisprudência do STJ.

Tanto isso é claro que, já em 2016, o Ministério da Cultura expediu duas instruções normativas que visavam garantir um maior controle sobre as execuções de obras musicais no ambiente digital.

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Uma dessas instruções já esclarecia os conceitos da legislação brasileira aplicáveis à internet, possibilitando que entidades de gestão coletiva de direitos autorais atuassem nesse ambiente, assim como já ocorre em diversos países do mundo.

A lei geral do turismo conceituou os quartos de hotéis como de natureza privada, sendo um ambiente de frequência individual e de uso exclusivo do hóspede

Isso mudou a relação dos autores brasileiros, que já podem assim exigir informações e eventuais recursos diretamente de plataformas estrangeiras que disponibilizam música por meio de streaming (uma forma de transmissão instantânea de dados de áudio e vídeo pela internet).

Esse fato, por si só, já demonstra que, a não incidência dos direitos autorais sobre execução de obras musicais em quartos de hotéis não necessariamente redundará em perda de receita das respectivas associações de autores, pois estas poderão exigir diretamente tais direitos dessas plataformas que disponibilizam as obras musicais.

Destarte, lutemos nas searas política e judicial e mui breve colheremos os frutos da justiça, que será a não incidência dos direitos autorais sobre a execução de obras musicais executadas nos interiores de quartos de hotéis.

*Huilder Magno de Souza é advogado atuante em Brasília (DF) e assessor jurídico da ABIH-Nacional – Contato hmsadvogados@hotmail.com

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Edgar J. Oliveira

Diretor editorial - Possui 31 anos de formação em jornalismo e já trabalhou em grandes empresas nacionais em diferentes setores da comunicação como: rádio, assessoria de imprensa, agência de publicidade e já foi Editor chefe de várias mídias como: jornal de bairro, revista voltada a construção, a telecomunicações, concessões rodoviárias, logística e atualmente na hotelaria.

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