EntrevistaMatérias

Paixão por implantar um hotel

A rede francesa AccorHotels vem se consolidando cada dia mais no mercado e a expectativa é de praticamente dobrar o número de hotéis na América do Sul nos próximos anos. Para que esses planos ocorram dentro do planejamento da rede, é essencial a participação de uma equipe de profissionais altamente capacitados para alavancar o crescimento da empresa na Região.

Comandando a implantação de novos hotéis da rede no mercado brasileiro e sulamericano, está o engenheiro Paulo Mancio, Vice Presidente técnico de implantação e patrimônio da rede na América do Sul. O executivo já coordenou mais de 200 projetos da AccorHotels no continente e tem como grande desafio motivar a equipe de profissionais envolvida nas implantações sempre trazendo inovação e qualidade nos projetos. Confira mais detalhes da trajetória de Paulo Mancio nessa entrevista exclusiva que ele concedeu a nossa equipe de redação quando estava em Paris, na França, na sede da AccorHotels.

Revista Hotéis – Qual sua formação acadêmica?
Paulo Mancio – Eu me formei em Engenharia Civil no ano de 1998 na escola de Engenharia Mauá e após isso eu fiz uma pós-graduação em Administração de Empresas na Fundação Getúlio Vargas. E também estudei direito em paralelo com a pós-graduação, só que não me formei, mas cheguei até o terceiro ano. Eu gostei muito de estudar direito, pois temos que ler bastante e acho uma disciplina bastante orientativa. Ter estudado direito foi bom para mim como cidadão, para conhecer meus direitos e saber cobrar das autoridades. No campo profissional, o direito é uma disciplina fundamental para entender a complexa legislação que temos e com isto melhorar a performance do meu trabalho.

Revista Hotéis – Como foi sua experiência de início de carreira como engenheiro civil?
Paulo Mancio – Durante minha escola de engenharia eu já estava trabalhando em uma construtora. Fiquei nela por alguns anos e alcancei o cargo de gerente de obras. Logo depois fui trabalhar em uma gerenciadora de obras chamada NBS Tec por cerca de cinco anos. Foi nessa gerenciadora de obras que eu comecei a entender como são as obras de hotéis, pois um dos ‘braços’ dessa empresa era só gerenciar obras hoteleiras. Então, naquela época eu tive a oportunidade de trabalhar com obras da AccorHotels, sem estar trabalhando na rede. Eu prestava serviços para a AccorHotels, assim como cheguei a gerenciar as obras da Meliá, IHG, entre outras redes internacionais. Essa experiência foi muito interessante para conhecer a qualidade, as demandas, as necessidades específicas, para entender esse mundo hoteleiro ligado à engenharia, que é um mundo absolutamente a parte.

Revista Hotéis – Você acredita que essa experiência na empresa gerenciadora de obras foi essencial para você compreender o mundo da hotelaria?
Paulo Mancio – Sem dúvidas. Pois eu tive a oportunidade de trabalhar em várias obras de diferentes cadeias hoteleiras, pois você começa a entender como que os hoteleiros pensam sobre as demandas. Assim como existe uma engenharia dedicada a escritórios corporativos, a hospitais e outras áreas, existe também uma engenharia e uma arquitetura toda desenhada para a hotelaria. Durante minha passagem pela NBS Tec trabalhei também em muitas obras da rede Atlantica Hotels, fiz muitas auditorias que me proporcionaram um grande aprendizado também.

Revista Hotéis – Como você entrou na rede francesa AccorHotels?
Paulo Mancio – Eu gerenciava algumas obras da Accor Hotels e em duas delas fizemos um trabalho muito bom em termos de cronograma, de qualidade e de financeiro. As obras foram o ibis de São José do Rio Preto e o antigo Fórmula 1 Paraíso, que acabou virando o ibis budget Paraíso, os dois no estado de São Paulo. Por conta do sucesso nessas obras, fui convidado no ano de 2001 pelo Odair Roque para trabalhar na AccorHotels, e em 2002 fui ser Gerente de Projetos Brasil na rede.

Revista Hotéis – Você tem o número de quantas implantações você já coordenou pela Accor Hotels?
Paulo Mancio – Eu já coordenei cerca de 200 implantações no total, entre obras e reformas isso, a nível Brasil e exterior. A minha carreira na Accor começou como Gerente de Projetos Brasil, logo depois fui promovido para Gerente de Projetos América do Sul, depois virei Gerente de Projetos América Latina. Depois, fui trabalhar no México, onde fiquei por dois anos e virei Diretor técnico adjunto no México, depois fui promovido para Diretor técnico adjunto pelo Brasil. Com a aposentadoria do Odair Roque, eu assumi o cargo de Vice Presidente técnico de implantação e Patrimônio da rede AccorHotels na América do Sul, onde permaneço até hoje.

Revista Hotéis – Dessas mais de 200 implantações que você coordenou, alguma delas teve um desafio maior e exigiu mais planejamento?
Paulo Mancio – Eu acho que todas as implantações que coordenei tiveram um encanto especial. As obras no Rio de Janeiro são sempre mais complexas em razão da escassez de mão de obra. Eu participei de uma grande reforma, que foi o Sofitel Copacabana que foi muito complexa, porque transcorreu enquanto o hotel estava em funcionamento, inclusive com o Presidente da República visitando o hotel. Também coordenei a obra do primeiro ibis da nova geração que nós abrimos no norte do México, que foi uma implantação inteira conduzida pela minha equipe e que foi muito prazerosa e muito interessante, pois abrimos novos horizontes em um novo país, e foi muito interessante fazer parte dessa nova cultura da AccorHotels, levando a expertise da rede.

Revista Hotéis – Implantar um hotel no exterior é completamente diferente do Brasil ?
Paulo Mancio – Em termos técnicos é basicamente a mesma coisa. Agora, os aspectos culturais, idioma, a distância da família, acredito que sejam uma das grandes barreiras em que o profissional tem que superar e ele deve ser muito perseverante. Acho que essa é uma das minhas grandes características, pois é preciso ser muito focado e automotivado.

Revista Hotéis – Conhecer a legislação do país onde você irá implantar um hotel também é importante nessas implantações no exterior?
Paulo Mancio – Evidentemente. No México, por exemplo, eu tinha uma equipe que acabava me ajudando a conhecer a legislação local. É fundamental ter este apoio local e compreender a legislação, sem isso você não consegue tocar a obra.

Revista Hotéis – Com relação à logística de entrega de materiais na implantação dos hotéis na América do Sul, vocês priorizam produtos locais ou adquirem no Brasil?
Paulo Mancio – Quando a gente faz um desenvolvimento de um novo projeto local, realizamos todas as compras no mesmo local. Mesmo que sejam importados, os fornecedores devem ter presença no país em que a gente está propondo esse novo projeto para ter mais garantia de entrega e pós venda. Assim como hoje eu sou o diretor técnico e nós temos projetos na Colômbia, Argentina, Chile, Peru e Uruguai, sempre agimos dessa mesma forma e prospectamos os fornecedores localmente. Em alguns países onde não é possível, acabamos importando, mas normalmente procuramos ter fornecedores de ordem internacional para atender em diversos países.

Revista Hotéis – Como você analisa a qualidade da mão de obra na implantação hoteleira no Brasil?
Paulo Mancio – O Brasil tem um tamanho continental, é como se tivéssemos vários países dentro do mesmo. É claro que perto das grandes capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, e algumas capitais do Nordeste e do Sul do Brasil a qualidade da mão de obra é melhor. Evidentemente que o acesso às novas tecnologias industrializadas também é mais difundido e a qualidade com certeza melhora. Em cidades mais distantes dos grandes centros, a dificuldade da logística é bastante importante e acabam impactando nos custos e na qualidade. Tem que haver um controle maior, uma atenção maior, pois pode impactar na questão do cronograma, onde em muitas cidades pode haver atrasos nas obras.

Revista Hotéis – Outra parte importante de seu trabalho na AccorHotels também é a reforma e manutenção das unidades existentes. Quais os hotéis que estão empenhados no momento?
Paulo Mancio – Eu cuido de uma área dentro da AccorHotels que é de manutenção preventiva que é o grande sucesso dos nossos hotéis. Temos um controle muito minucioso de toda a manutenção, dos contratos, dos equipamentos, aderência às leis, etc. Eu cuido tanto dos projetos que estão em manutenção, quanto dos hotéis já abertos. Nós estamos com grandes projetos hoteleiros em reforma, mas dois se destacam, pois são nossos maiores hotéis do Brasil que estão no Rio de Janeiro: são o Sofitel Copacabana e Caesar Park Ipanema, que estão passando por uma nova etapa de reforma. Existem duas questões complexas. A primeira delas é a questão da mão de obra no Rio de Janeiro que é extremamente escassa. Estamos em um ano pré-olímpico, onde os hotéis estão sendo construídos e devem ser entregues até o final do ano. Temos cerca de 17 projetos na capital fluminense, além dessas duas grandes obras de reformas citadas. A segunda questão é conduzir uma obra dentro de dois hotéis em operação sem perder a qualidade no atendimento aos clientes.

Revista Hotéis – Quais são os principais desafios em assumir um cargo como o seu? Quantas pessoas estão sob o seu comando? Como é sua rotina?
Paulo Mancio – Eu tenho hoje 25 pessoas sob minha responsabilidade. O principal desafio do meu cargo é manter minha equipe motivada a conduzir mais de 200 projetos em todo o continente. Acredito que esse seja o primeiro desafio, mantê-los motivados, cobrando performance, mantendo os nossos padrões técnicos que vão ter como consequência um bom projeto, uma boa implantação e um bom hotel, que irá performar financeiramente e propiciar uma boa experiência para os nossos hóspedes. Meu segundo desafio é manter a inovação. Todos os meses temos uma reunião, que é chamada Comitê Técnico, onde eu trago os gerentes da minha equipe, que são cerca de 12 pessoas. Lá discutimos todas as novas tecnologias que podemos implantar, quais são os riscos e vantagens, o que podemos ganhar em performance, quais são as dificuldades com as novas tecnologias. A AccorHotels há mais de três anos trabalha com seus projetos numa plataforma própria , o que acaba reduzindo muito os erros, pois ela faz uma compatibilização quase que automática de todos esses projetos.

Revista Hotéis – Vocês trabalham muito com implantação sustentável. Como vocês analisam a sustentabilidade dentro da implantação hoteleira?
Paulo Mancio – A sustentabilidade é um pilar fundamental em nossas obras e com toda certa um pilar fundamental para o futuro do nosso planeta. A AccorHotels acredita, e tem dentro de suas diretrizes, como o Planet 21, todos os nossos grandes sistemas de energias, de consumo, de ar condicionado e de chuveiros, tem uma vertente ambiental e de performance em termos de meio ambiente. Todos os dias a gente discute isso, em nossas grandes reuniões técnicas, sempre estamos focados em uma tecnologia que seja positiva, que traga melhores performances com menor consumo, e isso é sustentabilidade. Não é só aquela visão do meio ambiente, mas sim uma visão para o negócio, para sua continuidade, para o planeta e assim por diante. Nos hotéis que implantamos, procuramos utilizar tecnologia de altíssima performance de energia, como os painéis solares, que propiciam uma redução de 30% no consumo de gás para o aquecimento de água. Temos ar condicionado de última tecnologia do tipo VRV, fazendo uma comparação dos sistemas que usamos para os sistemas convencionais, temos quase 40% de redução no consumo de energia, e ele trabalha somente no sistema on demand.

Revista Hotéis – Quais os critérios que a AccorHotels adota para homologar um fornecedor?
Paulo Mancio – Existem dois grandes estágios para se homologar um fornecedor na AccorHotels. A partir do momento que a gente conhece um fornecedor e tem uma boa referência dele, normalmente fazemos uma reunião com ele, e dando certo, o utilizamos para um projeto ou para uma reforma. A partir desse momento, em que ele participou desse projeto e funcionou bem, nós discutimos todos os meses a continuidade em reunião interna do comitê técnico em que fazemos uma avaliação do trabalho deste novo fornecedor. A partir do momento em que ele for autorizado a dar continuidade com o trabalho, nós passamos a usar o termo de fornecedor recomendado pela AccorHotels, mas ele ainda não é homologado. Continuamos a testar esse fornecedor e partir desse momento nós o recomendamos para a área de compras compartilhadas que é conduzida pela nossa colega Gabriella Spinola. Ela irá fazer uma investigação técnica e financeira sobre o fornecedor, e aí nós casamos essas informações: a saúde financeira e a performance de nossos projetos. É muito importante que a gente tenha certeza da qualidade desse fornecedor, pois ele se torna uma referência e é por isso que nós tomamos muito cuidado ao homologá-lo. Dentro do programa global de sustentabilidade, o Planet 21, temos por responsabilidade compartilhar com nossos fornecedores nossa visão estratégica sobre responsabilidade social corporativa. Fazemos isso por meio da Carta 21 aos Fornecedores, que inclui uma série de itens aos quais o fornecedor da AccorHotels deve se comprometer ao fazer negócios conosco. Entre eles, a observação às leis locais contra a exploração sexual de crianças e adolescentes e trabalho escravo, bem como garantir práticas sustentáveis em sua operação.

Revista Hotéis – Como você analisa a figura do implantador hoteleiro no Brasil? Você acredita que o brasileiro compreende o trabalho de vocês?
Paulo Mancio – Eu acho que isso a cada dia vai sendo amadurecido. Não existe uma compreensão ainda 100%, existe um processo de amadurecimento do mercado. Eu acredito que nos últimos dez anos, com o aquecimento do mercado hoteleiro e com o desenvolvimento de vários projetos, houve sim uma maior difusão da questão do que é um implantador no Brasil. Tanto para engenheiro quanto para arquitetos. Implantação hoteleira já é uma disciplina estudada nos meios acadêmicos e eu tive o prazer de ser convidado há cinco anos para a dar aula em algumas universidades, para disciplinas relacionadas a arquitetura hoteleira, a manutenção de hotéis, a implantação de hotéis.

Revista Hotéis – Basicamente o que você ensina nesta disciplina? Lecionar é um prazer nas horas vagas?
Paulo Mancio – Hoje eu leciono em duas universidades e já temos mais de três turmas formadas. Nosso foco é explicar para o arquiteto que existem demandas específicas em um projeto hoteleiro que não são as mesmas de uma casa e de um escritório corporativo. É completamente diferente. A demanda de um hóspede é completamente diferente de qualquer outro indivíduo da sociedade. Nessas disciplinas explicamos essas demandas específicas os segredos, as diferenças e o dimensionamento. Hoje o meu grande prazer é dar aula.

Revista Hotéis – Como você concilia sua carreira de viagens, coordenando cerca de duzentas obras com essas aulas?
Paulo Mancio – Com muito trabalho. O principal conselho que eu dou para as pessoas é: Ame o que você faz. Acho que o segredo é gostar do que você exerce. É preciso conciliar com a família, amigos, com a saudade, mas gostar muito do que você faz e continuar em frente, saber que você tem uma missão maior. A vida tem momentos muito interessantes, muito doces, mas também com momentos muito amargos. E são justamente nesses momentos que você fica um pouco mais maduro e experiente. É nos tombos que você mais aprende, nos projetos mais complexos que você mais se fortalece.

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