Opinião

O desafio atual do setor hoteleiro

 

Artigo escrito por Mario Cezar Nogalez* 

 

Com o mercado aquecido, várias cidades pelo país afora estão com falta de unidades habitacionais, isto faz com que as tarifas aumentem devido à velha regra da oferta e da procura, contudo, isto não vai durar para sempre e mesmo com o mercado aquecido, a hotelaria vem encontrando várias dificuldades, seja ela pela falta de mão de obra, seja ela pela falta do profissionalismo existente; nunca antes este setor foi tão cobrado ou exigido.

 

Os estudos e artigos que já escrevi sempre demonstraram que o caminho mais amplo para a hotelaria sempre estará ligado à hospitalidade e a vitalidade de seus colaboradores e nesta oportunidade, com um aprofundamento filosófico para com o tema, tentarei esclarecer de forma mais clara possível o que de fato vem ocorrendo no setor hoteleiro.

 

Estamos Errados!

Sim caros leitores, a grande maioria de empresários e profissionais que ainda não percebeu deve acreditar que eu esteja um tanto insano e não é assim, Jung, como psicanalista entendia que somente com a certeza de que estamos errados é que teremos clareza do que somos e estamos errados porque, no Brasil, estamos tentando voltar para o século XX, para a era do industrialismo em plena era do conhecimento.

Se o leitor fizer uma pequena pesquisa poderão checar estes dados. Hoje os índices de exportações mundiais apontam para um produto que de fato não existe e com um pouco de análise podemos perceber que das exportações que mais cresce no mundo são as de “produtos” intangíveis ligados ao estudo e conhecimento, sejam eles softwares, consultorias, informações; estes “produtos” não são físicos não necessitam de portos, aeroportos ou estradas para serem comercializados mundo afora, isto confere a marca de transição da era industrial para a era do conhecimento, as relações de comercio e de consumo mudam radicalmente, uma vez que na era industrial o que mais vale é o controle dos recursos escassos e a competição, na era do conhecimento esta competição leva ao fracasso total e a aniquilação empresarial, mesmo daquelas que produzem produtos tangíveis (aqueles que devemos transportar ou carregar, seja uma caneta, seja ele um motor). 

Isto não quer dizer que a indústria irá desaparecer, pelo contrário, ela se transformará, assim como quando passamos da era feudal/agraria para a era industrial, a agropecuária não deixou de existir, apenas se modernizou utilizando os processos industriais e da mesma forma, a hotelaria, que evoluiu da hospedaria na era feudal, deve evoluir para outro patamar de prestação de serviços nesta era que já é um fato.

 

Podemos perceber a latente necessidade de transição da hotelaria quando vemos os números indicativos de sua capacidade de reter colaboradores, nos índices de satisfação dos hóspedes que a cada dia vem caindo com relação aos serviços prestados pelos hotéis em todo o território nacional, nos índices de lucratividade dos hotéis e nos valores de impostos pagos nessa terra tupiniquim, tudo isto de encontro a uma crise existencial mundial dos seres humanos; nunca antes houve tantas pessoas deprimidas na história de nosso planeta e isto se deve a um grande fato ligado à forma de sociedade que construímos ao longo dos últimos 200 anos de história.

 

Para que possamos compreender isto, devemos indubitavelmente verificar o que mais é prezado e valioso nesta era que é o conhecimento. Até a década de 1950 o acesso a escola era restrito e focada na formação de lideranças, o ensino básico como ler e escrever era comum a todos, contudo, o desafio era passar para outros níveis, apenas nossos colegas sexagenários se lembrarão que naquela época era necessário fazer testes de conhecimento para ter acesso ao colegial. Como tudo no Brasil chega atrasado, foi somente na década de 1960 que se repensou o formato acadêmico das escolas, para que assim o mercado fosse suprido de mão de obra qualificada, nossas escolas deixaram a formação de lideranças e passaram a formar empregados, ou seja, a nova formatação acadêmica exigia que as pessoas fossem muito menos questionadoras e muito mais passivas, o resultado disto é o que temos hoje, um enorme número de pessoas que não foram educadas a raciocinar, foram educadas para obedecer, e a partir dai você pode ver as consequências disto estamos vivendo numa sociedade que aceita a tudo sem questionar e o único comprometimento que têm é com o valor financeiro do que podem mostrar e não com o valor ético que têm, isto gera o verdadeiro conflito de interesses pessoais que encontramos na maioria das empresas, na hotelaria isto não é diferente uma vez que o individuo, a cada dia que passa se lhe é exigido a raciocinar de forma ampla e a resolver vários problemas ao mesmo tempo, em contrapartida, foi educado a deixar o raciocínio de lado e a seguir apenas e tão somente ordens porque justamente temos o mesmo modelo educacional da era industrial.

 

Outro ponto onde podemos observar que estamos na era do conhecimento é o fato de que nossos filhos solucionam vários tipos de problemas ao mesmo tempo, veja, por exemplo, esta imagem, quem hoje usa relógio de pulso? Somente aqueles que têm mais de 25 anos, os que têm menos não conseguem enxergar a funcionalidade de um item que tem apenas uma função, a de mostrar horas, hoje a “molecada” usam aparelhos que não só mostra a hora, mas serve para várias outras funções como calendário, agenda, contato com os amigos, fotografar, filmar, escrever poesia, ouvir musica e até mesmo acessar a internet e é neste ponto que estamos errados porque a forma de trabalho atual dentro dos hotéis, apesar de contemplar esta multifuncionalidade, não contempla a real necessidade de transformação do conhecimento.

 

Em geral, o formato hierárquico que temos dentro dos meios de hospedagem vão pelo caminho contrário a era do conhecimento, porque justamente a centralização de informações e o processo compartimentalizado de funções leva fadadamente ao caminho da morte empresarial, me explico melhor, enquanto estamos indo para o caminho de mais e mais especialização nas funções o que leva a somente enxergar parte da empresa e a alienação com relação ao todo se eximindo do que possa ocorrer nos outros setores, o que é justamente a era industrial, os colaboradores de forma pessoal estão indo para o caminho do compartilhamento de informações e conexão global, justamente pontos totalmente antagônicos. (o que é o mesmo motivo que vem gerando insatisfação me todas as escolas)

 

O que devemos de fato fazer?

Não há resposta certa para este tipo de pergunta já que nesta era, o que é verdade hoje para um, pode e não deve ser verdade para outro e pode mudar radicalmente amanhã, contudo, quando utilizamos de forma correta a Gestão por Receitas ou Revenue Management nos habituamos a observar padrões existentes num aparente caos. Um destes padrões foi analisado em 1995 por pesquisadores de gestão empresarial através da revista Fortune. Estes pesquisadores checaram as 500 maiores empresas de 10 anos antes, ou 1985, e compararam com o ano de 1995, fizeram o mesmo com 1986 e 1996 e assim por diante e o que eles encontraram foi muito esclarecedor, apenas uma média de 20 empresas se mantinham vivas durante estes 10 anos, as demais empresas, que não eram pequenas, haviam encerrado suas atividades ou haviam falido, aprofundando esta pesquisa, encontraram que estas 20 empresas tinham algo em comum, além de serem centenárias, elas se reciclavam e tinham uma visão ampla de seu negocio e de forma geral possuíam as seguintes características:

 

Visão sistêmica: nunca observavam sua empresa de forma pontual, mas sim de forma ampla e holística, cada ação leva a um efeito dominó de ações.

Foco em propósito e não no lucro, tem um objetivo claro na direção que não é apenas o resultado financeiro.

Tolerância: nunca buscaram culpados e sempre soluções aos problemas encontrados.

E por fim, sempre são muito Conservadores na gestão financeira, nunca indo atrás de modismos administrativos.

 

Trazendo isto para a hotelaria e como consultor lhes indico os seguintes remédios para sua gestão e assim trazer o seu hotel para a era do conhecimento, talvez lhe pareça radical contudo, você pode observar isto nos meios de hospedagem que dão certo e que estão a muito tempo no mercado, pasmem, em geral (não é regra) estes meios de hospedagem são pequenos e tem gestão familiar.

 

Visão Sistêmica: 

O Hóspede é Hóspede desde o momento que efetua a reserva até o momento de sua saída, mesmo um erro no fechamento de sua conta pode trazer abaixo todo o excelente trabalho realizado durante a sua hospedagem.

Todos os colaboradores e gestores devem ter a visão ampla e holística de que cada ação levará a um efeito dominó em todos os setores do hotel, seja ele operacional, de apoio ou não operacional, esta visão deve contemplar que todos os que colaboram dentro de seu meio de hospedagem devam conhecer o funcionamento de forma geral e de forma especifica para que possam tomar decisões rápidas e corretas.

 

Foco em propósito:

Aqueles meios de hospedagem que tem como foco o gerar lucro estão fadados ao fracasso, o propósito de qualquer meio de hospedagem é o de levar aos hóspedes experiências únicas e pessoais, mesmo no turismo executivo, hóspedes nunca devem ser visto como um saco de dinheiro, são pessoas que levam suas experiências para o mundo e não mais para um restrito grupo de amigos. Para ilustrar melhor este foco hoteleiro cito aqui dois grandes personagens:

 

“O Lucro é o oxigênio das empresas, contudo, viver é muito mais que respirar” (Peter Drucker).

 

“A hospitalidade é antes de tudo uma disposição da alma, aberta e irrestrita” (Leonardo Boff).

 

Tolerância nas adversidades

O pensar fora da caixa, ou fora dos padrões normais é o que de fato leva a excelência na prestação de serviços, uma vez que todo hóspede quer um pedaço da lua devemos servi-lo, isto quer dizer que a modalidade de chefias controladoras e centralizadoras somente levará ao seu fracasso, aquele sujeito que faz alguma coisa e busca o resultado real com foco hospitaleiro é o que te levará ao sucesso. 

Outro ponto fundamental neste quesito é de que nenhum ser humano é uma máquina, ou seja, nenhum ser humano é capaz de deixar os problemas ou o cérebro em casa e apenas e tão somente produzir, se o seu colaborador tem problemas pessoais, isto com certeza irá afetar o seu dia de trabalho e isto não é motivo para dispensá-lo, todos por natureza humana, são excelentes em alguma coisa, basta descobrir qual é esta excelência.

 

Ser financeiramente conservador em seus gastos

Se o lucro é o oxigênio da empresa, recursos financeiros é o sangue, ninguém vive sem oxigênio e ninguém é saldável com pouco sangue, logo, sair atirando nos modismos que aparecem a cada dia com certeza deixará a empresa doente e com falta de oxigênio, é preciso, antes de tudo, analisar o que de fato são estes modismos, exemplos não faltam, como sustentabilidade, ambientalismo, etc. e etc..

 

E se você ainda tem duvidas, analise o que anda fazendo, porquê seus colaboradores estão sendo trocados, se estão satisfeitos e principalmente se o seu hotel é hospitaleiro, a partir dai busque o que é necessário, hoje hotéis devem prover não somente camas confortáveis com banhos gostosos e café da manhã excelentes, eles, antes de tudo, devem atender ao hóspede como pessoas que são e tem as mesmas dúvidas e questionamentos que você e que de fato, hoje, todos estamos conectados.

 

 

 *Mario Cezar Nogalez é Consultor e diretor da SN Hotelaria Consultoria Especializada – Contato –mario@snhotelaria.com.br

 

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