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Hotéis de Belo Horizonte inacabados para a Copa do Mundo de 2014 serão multados

O Prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, sancionou recentemente o Decreto 17.086, que prevê multas milionárias para empreendimentos hoteleiros que se beneficiaram de incentivos municipais para atender a Copa do Mundo de 2014 e não foram concluídos no prazo. Com os incentivos da Lei 9.952/10 de Operação Urbana dos Hotéis Copa do Mundo FIFA Brasil 2014, 35 hotéis foram beneficiados, mas eles teriam que estar prontos até 30 de março de 2014 e funcionar pelo menos por dez anos consecutivos a partir da abertura. Mas isso não aconteceu em 11 empreendimentos, que terão que quitar um débito milionário com a prefeitura, sem direito a descontos sendo que, em algumas obras inacabadas, estas multas poderão ultrapassar R$ 100 milhões.

O ex-prefeito Márcio Lacerda tentou solucionar essa cobrança através da Lei 10.911/2016, mas não obteve êxito, pois propunha um desconto de 50% dos valores das multas calculadas sobre os hotéis que não entraram em operação até 31 de março de 2014 (Copa do Mundo). No entanto, estendendo o período para operação mínima do hotel como tal de dez para 20 anos. Além disso, seria exigida uma confissão de dívida assinada pelo incorporador ou construtor e adicionais 25% de desconto para adesão em até 60 dias pós-publicação em Diário Oficial.

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“Com isso, e com base nos valores milionários advindos dos cálculos (muitos deles em valores superiores aos valores venais dos terrenos em questão), mencionei na ocasião que não haveria adesão ao plano, o que se confirmou pouco depois. Um hotel não inaugurado e, consequentemente, sem receitas advindas de sua exploração não poderia jamais assumir tais compromissos financeiros adicionais além dos já existentes.

Kênio Pereira: “A Prefeitura de Belo Horizonte falhou em não buscar uma consultoria especializada em hotelaria de credibilidade e isenta de interesses” – Foto – Divulgação

Com certeza faltou planejamento por parte da Prefeitura de Belo Horizonte na concessão destes incentivos”. Quem defende isso é o advogado Kênio Pereira, Presidente da Comissão de Mercado Imobiliário da OAB-MG – Ordem dos Advogados do Brasil, seção de Minas Gerais. “O grande problema foi a falta de planejamento dos construtores, que viram uma oportunidade de faturar valores elevados com autorização de aumento do coeficiente de aproveitamento para até cinco vezes a área do terreno. Um bom exemplo foi o Hotel Site Savassi (Novotel + Ibis) na Av. do Contorno (comercializado pela Incorporadora Maio e construído pela Construtora Paranasa). Essa ganância em ganhar muito, sem ter realizado estudos aprofundados de mercado com especialistas em hotelaria, motivou construtoras a se aventurarem em lançamentos de hotéis de forma amadora. Eles passaram a ideia aos compradores de que os efeitos de atração de turistas pela realização da Copa do Mundo de 2014 fosse perdurar por muitos anos e não por apenas dois meses”, revela o advogado.

Faltou estudo de viabilidade

Ele lembra que diversos estudos apresentados, como pela CoHotel em 2011, citavam que Belo Horizonte necessitaria de uma oferta total de 13.000 UHs em até cinco anos (até 2016). “Na época nossa oferta contemplava 8.056 UHs (em 86 hotéis). Com a enxurrada de novos hotéis (+ 44 novos empreendimentos lançados somados a vários outros projetos sequer iniciados!!!) surgiram mais 5.983 UHs. Um acréscimo absurdo de 42%, elevando para 14.039 UHs na praça belorizontina. Como os 11 hotéis que não entraram em operação dentro da data estipulada, e estão sujeitos as penalidades caso um dia venham a ser abertos (o que o mercado não deseja), a oferta total passará a 17.232 UHs. Ou seja, 33% acima do que os duvidosos estudos de 2011 apontaram. O grande e crasso erro dos ‘estudos’ de viabilidade da época foi não considerar os demais projetos em curso. Algumas construtoras fizeram seus clientes crerem que somente eles fariam um novo hotel e não as demais construtoras, o que demonstra certa má-fé ou então, pelo menos, incompetência”, destaca Kênio.

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Diante da situação que foi criada, prejudicando o parque hoteleiro da capital mineira, além de lesar muitos investidores, o advogado Kênio não tem dúvida em apontar um culpado. “A Prefeitura de Belo Horizonte falhou em não buscar uma consultoria especializada em hotelaria séria e sem interesses, que poderia apurar o cenário do setor e indicar um limite de novas unidades hoteleiras. Isso evitaria a super oferta instalada que acarretou a baixa rentabilidade dos hotéis que foram concluídos e ao final além do total desinteresse dos que estão inacabados em assumir as multas. Em 2012, participei de várias palestras que deixaram claro as falhas que a Prefeitura de Belo Horizonte cometeu e as construtoras se aproveitaram e lançaram empreendimentos sem dominar as particularidades do setor. Caso os membros do Poder Executivo da Município, os construtores e os compradores tivessem contratado uma consultoria não teríamos os problemas que a cidade está enfrentando, com 11 hotéis, alguns entregues para operação depois do prazo e outros que nunca serão concluídos, gerando prejuízos para milhares de pessoas que compraram as unidades na planta. O número de lançamentos seria bem menor e não haveria a super oferta que gerou a queda da rentabilidade com a ‘Guerra de Preços’ das diárias”, lembra o especialista.

Confira abaixo os 11 hotéis que se beneficiaram dos incentivos da prefeitura de Belo Horizonte para atender a demanda de hospedagem para a Copa do Mundo de futebol de 2014. Alguns entraram em operação depois do prazo previsto e outros que não conseguiram ser concluídos e ambos estão sujeitos a estas multas milionárias:

Novotel Suites Savassi

Ibis Budget Savassi

Blue Tree Stadium Pampulha

Plaza Belo Horizonte

Bristol Multy Horizonte Buritis

Meliá Cidade Nova

Apart Hotel Dom Gustavo Pampulha

Pullman Raja Gabáglia

Ibis Raja Gabáglia

Arena Hotel Mineirão

Soft Inn Belo Horizonte

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Quem vai pagar as multas?

O advogado Kênio não tem dúvida e diz: “Com certeza o dever de pagar as multas é das incorporadoras e das construtoras, pois foram elas que projetaram e lançaram os empreendimentos. Com isso, faturaram financeiramente com as vendas das unidades do condo-hotéis para milhares de consumidores que não perceberam os riscos que corriam. Esses compradores foram enganados, pois na realidade não compraram uma propriedade imobiliária, já que não têm o direito de utilizar os apartamentos para morar e nem para locar para terceiros conforme seu interesse, não tendo como sair do pool hoteleiro. Ou seja, o que fizeram foi um investimento coletivo, como eu alertei em 2011 e que ao final a CVM – Comissão da Valores Imobiliários divulgou em 2013.  Basta ver que o Código Civil define o que seja propriedade: ‘art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem que quer injustamente a possua ou detenha’, o que deixa claro que os compradores foram iludidos, de forma engenhosa, ao pensar que seriam realmente proprietários de um imóvel. Simplesmente deram dinheiro para um construtor ganhar mais do que o normal, vendendo pequenos quartos a preços super elevados, os quais, quando funcionarem, darão lucro em primeiro lugar para as Operadoras (que não correm nenhum risco) e, se faltar dinheiro, caberá ainda compradores arcarem com o rateio dos prejuízos. Esses são os correm risco, pois só ganham alguma coisa se o hotel tiver uma ocupação elevada e com diárias cobradas em valores minimamente razoáveis. Não é o que se constata através da super-oferta atual onde a ‘Guerra de Preços’ joga todos conjuntamente para baixo”.

Maarten Van Sluys: “Haverá uma judicialização do passivo que perdurará por vários anos” – Foto – Divulgação

Completo descompasso

O Consultor-Asset Manager Hoteleiro Maarten Van Sluys segue a mesma linha de raciocínio do Advogado Kênio e destaca que houve um absurdo e completo descompasso. “A Lei 9.952 provocou uma corrida ao ‘pote de ouro’ por parte das construtoras e incorporadoras atraídas pelo potencial construtivo potencializado, em média, entre 1,5 a 5 vezes a área dos terrenos conforme a localização. Muitos projetos nasceram em áreas sem a mínima vocação hoteleira. ‘Estudos de viabilidade’ foram produzidos indiscriminadamente e sem credibilidade, sempre visando atrair investidores. Promessas além dos limites foram veiculadas e, não obstante o fato da crise macroeconômica que abateu o País e que anteriormente não foi prevista, excedeu-se nas estimativas muito além de otimistas (na verdade ufanistas) sobre o desempenho futuro da hotelaria sob a ótica da rentabilidade. Este descompasso ainda penalizará os resultados do mercado Belo Horizonte por alguns anos. Hoje presenciamos um leilão invertido de tarifas em que hotéis com excelente qualidade são vendidos por diárias muito aquém das ideais e que penalizam a operação, pois estes novos hotéis não terão recursos em caixa para que em um futuro não muito distante possam renovar suas instalações”, diz o Consultor Sluys.

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Assim como o Advogado Kênio, Sluys não acredita que a nova Lei (mais um arremedo das 2 anteriores), obterá adesão e sua aplicabilidade desde já está comprometida e ele explica: “Os incorporadores, cujas obras estão paralisadas em sua quase totalidade, não têm fôlego financeiro algum para arcar com qualquer tipo de penalidade. Já os hotéis que entraram em funcionamento após o prazo estipulado seguem em grande parte operando abaixo da linha de ponto de equilíbrio. Os proprietários (adquirentes das unidades) não seriam em hipótese alguma os responsáveis por este ônus. Já as construtoras ou incorporadoras que aprovaram os projetos interporão defesa as autuações e haverá uma judicialização do passivo que perdurará por vários anos. Por sua vez, por força legal baseada na Lei de Responsabilidade Fiscal o Poder Executivo não poderá isentar os faltosos da cobrança das multas. Um imbróglio jurídico se acena pelos próximos anos sem solução viável a vista”, assegura Sluys.

O site do hotel Savassi (Novotel + Ibis) se beneficiou dos incentivos para a Copa do Mundo de Futebol de 2014, mas deverá ficar pronto somente no próximo ano – Foto – Divulgação

Confiança nas promessas

Das nove obras que permanecem paradas dificilmente serão executadas, somente o site do hotel Savassi (Novotel + Ibis) na Av. do Contorno, possui previsão de ser inaugurado até o fim de 2020. Mesmo assim, nos próximos três anos, a hotelaria da capital mineira não terá condições de absorver o aumento de uma eventual oferta adicional. A expectativa do mercado é que estes hotéis em execução (poucos dentre os projetos não ainda concluídos) sejam convertidos em empreendimentos ligados a outras finalidades. Em alguns casos, estas obras em curso poderão se adaptar ao uso residencial com devidas adaptações de projeto.

E nesse imbróglio o mais prejudicado é quem confiou nas promessas das construtoras e incorporadoras e que, após obter o aval das administradoras hoteleiras, fez o investimento. “Os investidores destes projetos são os maiores perdedores desta equação. Em quase todos os casos pagaram sinais de negócio, ou mais que isso, pagaram várias parcelas mensais ou quitaram as unidades habitacionais à vista sem que tenham obtido qualquer retorno até hoje. Muitos deles não obtiveram sequer escrituras ou registros imobiliários de suas aquisições devidos a problemas diversos na origem da regularização dos imóveis. Apostaram, quase às cegas, em projetos duvidosos e em grande parte levados a cabo por micro construtoras sem lastro econômico algum. Boa parte das construtoras apostava em vender as unidades habitacionais e apenas então com estes recursos recebidos viabilizar a execução do cronograma de obras. Faltou desde sempre que a CVM – Comissão de Valores Mobiliários – entrasse em ação e vetasse estas pseudo-incorporações. Para estes investidores a nova lei regulatória sancionada, novamente falha e mal redigida, chegou muito tarde, concluiu Sluys.

A Prefeitura de Belo Horizonte foi procurada por nossa reportagem para esclarecer o assunto, mas se limitou a informar que “não iria se posicionar”.

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Edgar J. Oliveira

Diretor editorial - Possui 31 anos de formação em jornalismo e já trabalhou em grandes empresas nacionais em diferentes setores da comunicação como: rádio, assessoria de imprensa, agência de publicidade e já foi Editor chefe de várias mídias como: jornal de bairro, revista voltada a construção, a telecomunicações, concessões rodoviárias, logística e atualmente na hotelaria.

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