Copa de 2014 deixa 90 hotéis fechados em oito das 12 sedes
O número de turistas estrangeiros que visitam o País anualmente não consegue romper a barreira histórica dos 6 milhões ano e fica o questionamento. Qual legado esses eventos deixaram para o Brasil?
Para receber a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, o Brasil fez um investimento muito alto em estádios e equipamentos. O objetivo era colocar o País nos holofotes do turismo mundial, mas hoje o que se constata é que houve muita malversação de dinheiro público e verdadeiros monumentos ao desperdício estão se deteriorando Brasil afora. O número de turistas estrangeiros que visitam o País anualmente não consegue romper a barreira histórica dos 6 milhões ano e fica o questionamento. Qual legado esses eventos deixaram para o Brasil? E no segmento hoteleiro não foi diferente. Criou-se uma expectativa muito grande de que era necessário renovar o parque hoteleiro para receber os turistas. Houve muita especulação em cima do ‘tijolinho imobiliário hoteleiro’ e o resultado é taxa de ocupação despencando cada vez mais. Cidades como Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre e a Barra da Tijuca no Rio de Janeiro são bons exemplos.
Especulação imobiliária em Belo Horizonte
A Prefeitura de Belo Horizonte publicou em 2010, a Lei nº 9952/2010, com o objetivo de incentivar a construção de novos hotéis na cidade para suprir a demanda de hóspedes. Esta lei estipulava que os empreendimentos deveriam estar em pleno funcionamento até o dia 30 de março de 2014, as construtoras teriam que arcar com altas multas para o município.
Porém, a cidade acabou sendo vítima de alguns empresários inescrupulosos que aproveitaram um incentivo do governo municipal para ampliar o número de hotéis para atender a demanda da Copa do Mundo de 2014 e especularam de forma irresponsável em cima do “tijolinho hoteleiro”. Por conta desta lei de incentivos, deram entrada na Prefeitura de Belo Horizonte 74 projetos e que foram aprovados, sendo a grande maioria puramente especulativos.
Segundo dados da Prefeitura de Belo Horizonte, apenas 13 hotéis que haviam sido licenciados para a Copa do Mundo de 2014 concluíram a obra e atestaram o início das atividades nos prazos planejados. De 2014 até o ano passado, outros 29 entraram em funcionamento na capital, mas no mesmo período 14 empreendimentos, entre hotéis e pousadas, encerraram suas atividades depois da Copa. Entre eles estão: Hotel Habitar, Bragança, Niagara Flat, o Liberty, o Square, o Metropolitan e o Flamboyant. Isso foi o efeito da superoferta de empreendimentos hoteleiros, assim como empreendimentos que não se modernizaram. E mesmo com o fechamento de 14 hotéis nos últimos anos, a taxa de ocupação, que antes da Copa do Mundo de 2014 era de 70% acumulado ano, hoje não consegue romper a casa dos 50%. Isso fez com que vários hotéis começassem a literalmente leiloar a diária para manter taxa de ocupação.
No levantamento da ABIH Nacional – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis – ABIH Nacional o fechamento de hotéis nos últimos anos em Belo Horizonte chega a 23, seguida por Salvador com 21 hotéis fechados, Porto Alegre com 16, Rio de Janeiro com 13, Cuiabá com sete, Manaus com quatro e Brasília com dois empreendimentos. São Paulo, Recife, Fortaleza e Natal não registraram o fechamento de hotéis, sendo que na capital do Rio Grande do Norte houve a abertura de seis estabelecimentos e duas novas unidades foram inauguradas em Fortaleza.
Situação no Rio de Janeiro
Com a especulação imobiliária na capital fluminense em torno da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, a cidade passou a disponibilizar 58.983 leitos, um aumento de 64,3% em relação aos 35.899 existentes em 2012. Mas diante dos vários problemas que a cidade enfrenta, 13 hotéis fecharam nos últimos anos, sem contar outros três que estão fechados, indefinidamente, para reformas. Com isso, houve menos 2.828 apartamentos para receber os turistas e mesmo assim, a taxa de ocupação despencou. Segundo dados da ABIH-RJ – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio de Janeiro, a taxa de ocupação média no último mês de julho, normalmente um bom período por causa das férias escolares, fechou em 42,60%. Mas em regiões como a da Lapa e do Porto a ocupação média na área, foi de apenas 23,4%. Já na Barra da Tijuca e São Conrado, a taxa de ocupação no último mês de julho foi de 37,80%.
Entre os hotéis que fecharam as portas estão verdadeiros ícones como o Marina Palace, que foi eternizado na música Virgem da cantora Marina Lima. O empreendimento está passando por uma grande reforma e tem previsão de retomar as atividades já no próximo ano. O Hotel Nacional, localizado em São Conrado ficou fechado por 21 anos e reabriu no final de 2016 através da bandeira Gran Meliá após uma reforma que consumiu cerca de R$ 400 milhões, mas menos de dois anos após a abertura, fechou as portas. O Sofitel, localizado no final da praia de Copacabana está fechado desde maio de 2017, pois se encontra numa ampla reforma. A previsão da AccorHotels é que o empreendimento reabra as portas no final do próximo ano com a bandeira de luxo Fairmont. Já o hotel Ipanema Plaza passa por uma queda constante na taxa de ocupação, ainda não fechou as portas, mas o site não aceita mais reservas.
Entre outros empreendimentos que encerraram a operação estão: Hotel Rio Nice, Hotel Toledo, Hotel Lido, Hotel Beija Flor, Hotel Flamengo Palace, Hotel Metropolitano Rio, íbis Budget Centro, íbis Porto Atlântico e hotel São Francisco.
Para Alfredo Lopes, Presidente da ABIH-RJ – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio de Janeiro, a falta de investimentos na divulgação do destino Rio de Janeiro é a principal responsável pela atual situação, superando até mesmo a violência. “Depois das Olimpíadas, não tivemos nenhuma propaganda para atrair o consumidor final e assim vender o Rio em todo País e no mundo. Mas estamos trabalhando em parceria com órgãos públicos e entidades para captar R$ 30 milhões para divulgação, o que representa três vezes mais do que o valor que dispomos hoje”, diz Lopes.
Situação crítica em Salvador
Segundo a pesquisa da ABIH Nacional, depois de Belo Horizonte, Salvador é a capital que mais teve hotéis fechados nos últimos anos, chegando a 21 empreendimentos. A razão nesse caso não foi especulação imobiliária, mas em grade parte a falta de investimentos em modernização. Com isso o setor perdeu receita da ordem de R$ 1,5 bilhão, segundo estimativas dos empresários. Entre os empreendimentos que fecharam as portas nos últimos anos estão: Pestana Bahia, Hotel Lazer Piatã, Corsário Praia Hotel, Porto Farol Apart Hotel, Pousada Bayona, San Marino Hotel, Hotel Solar Diana, Villa Giuliana Residence, Albergue do Porto, Pousada Redfish, Hotel Litorâneo. Com isso, mesmo sendo uma das cinco cidades com maior número de leitos de hotel, Salvador vive a realidade de ter uma média de quase 18 mil camas vazias por dia, segundo dados da ABIH – BA – Associação Brasileira da Indústria Hoteleira da Bahia. A taxa de ocupação não consegue romper a casa dos 50% e grande parte da hotelaria local trabalha no vermelho.
Porto Alegre é uma praça preocupante
Porto Alegre também é outra praça preocupante para a hotelaria e vive um mal momento em que a taxa de ocupação pouco ultrapassa a casa dos 50%, contra 62% em junho de 2014, antes da Copa do Mundo. De acordo com o SHPOA – Sindicato de Hospedagem e Alimentação de POA e Região, a capital gaúcha teve 16 hotéis fechados nos últimos anos, e entre eles estão: Hotel Açores, Hotel Bragança, Rishon Hotel, Hotel Marechal, Relíquia Hotel, Hotel Pampa II, Hotel da Paineira, Plaza Porto Alegre Hotel (Plazinha), Master Premium Palace, Arvoredo Residence, Ponte de Pedra Hotel, Hotel Royal Palace.
Confluência de vários fatores
Manoel Cardoso Linhares, Presidente da ABIH Nacional, aponta vários fatores que culminaram com o fechamento de pelo menos 90 unidades hoteleiras, em oito das 12 cidades-sede, após o final da competição. “A alta carga tributária, somada à falta de políticas de incentivos e de divulgação dos destinos, a ausência de regulamentação dos aplicativos de reservas de hospedagem em residências, além dos níveis críticos na área de segurança e da crônica falta de infraestrutura do País. Esses fatores aliadas a uma malha aérea cara e segmentada, determinam a dificuldade de expansão do setor turístico no País. Vale lembrar que hoje o Brasil investe apenas US$ 16 milhões na divulgação de seus destinos, enquanto o México investe US$ 490 milhões, a Colômbia US$ 100 milhões e o Equador US$ 90 milhões.
Linhares defende que é fundamental importância que essas, entre outras pautas do turismo e da hotelaria avancem e sejam incluídas na reforma da LGT – Lei Geral do Turismo. “Tudo isso combinado se torna um grande impeditivo para a indústria de turismo atuar com grande relevância na economia do país, gerando mais empregos e renda. Precisamos trabalhar ainda mais para que pontos como a regulamentação das plataformas de venda de hospedagem e o valor dos tributos pagos por elas sejam direcionados para um fundo que financie a divulgação estratégica dos múltiplos destinos do Brasil, entrem na atualização da Lei Geral do Turismo” defende Linhares.
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