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Especulação afetou hotelaria e investidores em Belo Horizonte

Obras paralisadas e em atraso acabaram lesando muitos investidores, que aguardavam altos índices de rentabilidade e agora estão recorrendo ao judiciário por conta do que consideram propaganda enganosa
Quando o Ford modelo T já havia virado um sucesso de vendas nos anos 30 do século passado, Edsel Ford, filho do fundador da montadora americana, identificou um lote de veículos abaixo dos padrões estabelecidos. Preocupado com os efeitos que isso pudesse trazer, comunicou o problema ao pai. Henry não vacilou em sua resposta e disse: “Não se preocupe, filho. Vamos vender todos, pois a cada minuto nasce um bobo que compra qualquer coisa”. Isto pode ser uma história do outro século de como o consumidor era tratado, mas pode se encaixar dentro da atual realidade da hotelaria de Belo Horizonte. A cidade foi vítima de alguns empresários inescrupulosos que aproveitaram um incentivo do governo municipal para ampliar o número de hotéis para atender a demanda da Copa do Mundo de 2014 e especularam de forma irresponsável em cima do “tijolinho hoteleiro”.

Este mesmo cenário já havia acontecido na cidade de São Paulo no final dos anos 90 com o lançamento generalizado desse tipo de imóvel que deixou um rastro de prejuízos para a hotelaria paulistana. O boom da hotelaria colocou no mercado quase 30.000 apartamentos em apenas cinco anos fazendo com que São Paulo tivesse por volta de 66 000 leitos e encostou na época em Nova York que apresentava 67.000 apartamentos. A diferença é que a cidade americana recebia, em média, 37 milhões de viajantes por ano e São Paulo, apenas 5 milhões. Este cenário gerou várias batalhas jurídicas que se arrastam até os dias atuais e deixou muitos investidores lesados que acreditaram estar fazendo um ótimo investimento no conceito de flats.

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Para atender os milhares de turistas que vieram para o Brasil durante a Copa do Mundo de Futebol, que aconteceu no ano passado, a Prefeitura de Belo Horizonte publicou em 2010, a Lei nº 9952/2010, a qual tinha o objetivo de incentivar a construção de novos hotéis na cidade para suprir a demanda de hóspedes. Porém, o ‘tiro’ acabou saindo pela ‘culatra’, e muitos projetos foram lançados, e agora a cidade sofre com a superoferta de empreendimentos hoteleiros, além de diversas obras paralisadas e em atraso. A taxa média de ocupação antes deste plano de incentivos ficava em torno de 70% acumulado/ano, mas hoje está em torno de 41% de acordo com o Placar da Hotelaria, um estudo realizado pela Hotel Invest e pelo FOHB – Fórum dos Operadores Hoteleiros do Brasil. A tendência é que a taxa de ocupação caia ainda mais neste ano, quando deverá entrar em operação novos hotéis. E o reflexo já é sentido com tradicionais hotéis que encerraram as atividades, como o luxuoso Liberty Savassi, assim como o Promenade Volpi e o Square.

De acordo com um consultor hoteleiro, que pediu para não ser identificado, vem sendo alertado desde 2009 que a cidade de Belo Horizonte iria sofrer com a superoferta de hotéis, e que de fato a lei nº 9952/2010 incentivou de maneira excessiva a construção de novos hotéis e não existia a necessidade desse incentivo de maneira super-dimensionada. “O destino de Belo Horizonte foi sacramentado quando todos esses projetos foram anunciados e construídos. Essa crise não será passageira e durará por muitos anos. Para melhorar dependerá muito do crescimento econômico brasileiro que beneficie a cidade”, afirma a fonte.

De fato, o cenário econômico brasileiro influenciou neste cenário, onde entre 2009 e 2010, o Brasil registrava o maior crescimento do PIB dos últimos 25 anos, alcançando a casa dos 7,5%, e acabou fechando o último trimestre de 2014 em 0,7%, de acordo com o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e estatística.

Dados do Placar da Hotelaria de 2010 apontavam que no ano de 2009, a capital mineira possuía em torno de 6.000 UH´s e 74% de ocupação média. Em 2014, ano da Copa, a cidade contava com cerca de 10 mil UH’s e cerca de 41%. A projeção para os próximos anos, de acordo com o estudo, é de que a cidade alcance cerca de 15 mil apartamentos, em um cenário que deverá ser cada dia mais difícil para os hoteleiros. “Se formos comparar a capital mineira em 2009, com 6 mil quartos, com 2014, com 10 mil, vemos um acréscimo muito alto de unidades habitacionais, o que torna evidente que os próximos anos para a capital não serão fáceis”, relata a fonte do setor.

Lei de incentivos
Publicada em 5 de Julho de 2010, a Lei nº 9952 foi estabelecida visando instituir “a operação urbana de estímulo ao desenvolvimento da infraestrutura de saúde, de turismo cultural e de negócios, visando atender às demandas da Copa do Mundo Fifa Brasil 2014 no Município”, ou seja, dar incentivos para a cidade, a fim de se estruturar para recepcionar os turistas durante a Copa.

Esta lei estipulava que os empreendimentos deveriam estar em pelo funcionamento no dia 30 de março de 2014, as construtoras teriam que arcar com altas multas para o município. Porém, nove meses após o fim do prazo, Belo Horizonte ainda conta com diversos hotéis que se beneficiaram com esta lei com obras atrasadas ou então paralisadas, e sem terem sofrido nenhuma multa por parte do município. Segundo a Prefeitura de Belo Horizonte, todas as obras dos hotéis em construção estão sendo vistoriadas e que somente após esse processo de apuração estar completo, a prefeitura dará prosseguimento aos procedimentos estabelecidos pela legislação e à divulgação do balanço das ações executadas.

Patrícia Coutinho:A lei que impulsionou a construção durante a Copa foi bem intencionada, mas ingênua e trouxe consigo vários empreendedores que de nada sabem de hotelaria”. Crédito da foto – Divulgação

Na visão da Presidente da ABIH-MG – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do estado de Minas Gerais, Patrícia Coutinho, a lei lançada pela Prefeitura de Belo Horizonte, desestabilizou a hotelaria mineira. Segundo ela a falta de planejamento e o desconhecimento do mercado hoteleiro fez com que muitos hotéis fechassem suas portas. “A lei que impulsionou a construção durante a Copa foi bem intencionada, mas ingênua e trouxe consigo vários empreendedores que de nada sabem de hotelaria. Se não houvesse a Copa ou a lei, a construção de hotéis teria sido suprida de forma gradual e saudável, de acordo com a demanda do mercado. Na minha opinião, à época deveriam ter aproveitado estudos de consultoria feitos justamente para avaliar a real demanda da cidade a fim de conceder alvarás de construção para novos hotéis. Infelizmente nada disso foi observado e foram concedidos 83 alvarás de construção! Imagine só se todos eles tivessem mesmo saído do papel”, avalia.

De acordo com Patrícia Coutinho, o fechamento de empreendimentos por conta da superoferta acaba afetando no mercado de trabalho de Belo Horizonte, além dos investidores que foram lesados por terem aplicado capital em empreendimentos que estão com obras paralisadas. “Estamos perdendo postos de emprego e recolhimento de tributos, além do prejuízo de vários microempreendedores que aplicaram seu suado dinheiro e estão na justiça para reaver seu investimento, impulsionados por uma propaganda no mínimo tendenciosa de dividendos mensais irreais”.

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Obras atrasadas
Como se já não bastasse a superoferta de leitos hoteleiros, a capital mineira ainda deverá receber nesse ano, novas aberturas de hotéis. De acordo com o consultor Maarten Van Sluys, da JR & MvS Consultores, atualmente a cidade conta com 12 hotéis com obras atrasadas (2.154 UH’s no total) e quatro hotéis com obras paralisadas e sem previsão de abertura. A projeção é de que Belo Horizonte tenha até o final desse ano um total de 15.204 apartamentos. E por conta do atraso nas obras, muitas construtoras estão recorrendo a liminares na justiça para não serem penalizadas com multas milionárias, previstas pela lei nº 9.952, pelo atraso na entrega da obra. E se a prefeitura resolver aplicar o rigor da lei, muitos hotéis vão se tornar inviáveis. Um bom exemplo é na região Centro-Sul, onde o CA — Coeficiente de Aproveitamento era de 1 e foi para 4,5 em alguns casos, e considerando-se o valor venal do terreno de R$ 7 mil por m2, a multa pode ser de R$ 7 milhões para cada mil m².

Porém, este assunto tem gerado intensa discussão, pois muitas construtoras conseguiram entregar os hotéis no prazo estipulado pela lei, tendo até que elevar os custos da obra com mão de obra e materiais para concluí-la, e não acham justo que quem não cumpriu o prazo seja perdoado da dívida. Tentando encontrar uma solução ao problema, o Vereador Marcelo Álvaro Antônio (PRP), deu entrada na Câmara dos Vereadores da Prefeitura de Belo Horizonte, no Projeto de Lei nº 999/2014, com o objetivo de estender o prazo de entrega das obras para o final de maio deste ano. Mas muitos empresários defendem que não sejam aplicadas as multas milionárias pelo atraso das obras e se faça um projeto de lei que anistie a todos.

Na visão de Pablo Ramos, CEO da Rede Impar Hotéis – PGCR Consultoria e Administração Hoteleira, as empresas que conseguiram concluir as obras no período estipulado pela lei, deveriam ser beneficiadas de alguma forma. “Em relação às empresas administradoras e construtoras que conseguiram cumprir o cronograma, acredito que elas terão que se posicionar veemente, mesmo que através de uma ação pública, para que a prefeitura tome medidas e puna quem descumpriu os prazos do regulamento. Agora, caso os hotéis que atrasaram suas obras sejam realmente anistiados, espero que a prefeitura consiga realizar algum tipo de mobilização que proporcione benefícios exclusivos para os empreendimentos que finalizaram as obras na data correta”, afirma.

Maarten Van Sluys: “a lei foi lançada com a ideia equivocada de que a capital mineira necessitava de uma expansão do parque hoteleira” – Crédito da foto – Divulgação

De acordo com Sluys, no mesmo período da publicação da lei de incentivos, o futuro atraso nas obras já havia sido previsto por estudos mercadológicos, e segundo ele, a lei foi lançada com a ideia equivocada de que a capital mineira necessitava de uma expansão do parque hoteleiro. “Acho importante destacar que a lei 9.952 foi criada com base na inequivoca necessidade de renovação e expansão do parque hoteleiro de Belo Horizonte, se baseando em estudos independentes realizados nos anos anteriores onde, em especial nos dias úteis a cidade não atendia a demanda. Esta lei foi redigida sem os apêndices necessários para criar controles relativos à quantidade de projetos, estudos situacionais por região e uma equação de razoabilidade para o cálculo das penalidades. Registra-se claramente a pouca ou nenhuma atuação de especialistas de mercado na redação da lei, feita às pressas para atender uma exigência da FIFA”, enfatiza Sluys.

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Com relação aos empreendimentos com obras em atraso, Sluys analisa que já era possível prever que isso iria ocorrer. “Essa problemática já havia sido prevista quando do entendimento da própria redação da lei municipal aprovada. Conforme meus acompanhamentos mensais do status das obras e o evidente cancelamento de inúmeros projetos (já inviáveis em seu nascedouro), previ que boa parte dos hotéis não cumpriria o prazo limite estabelecido.

Com os subterfúgios previstos também em leis, seria evidente que as milionárias multas iriam para os tribunais baseados em mandados de segurança e liminares que justificam de todas as formas a não conclusão das respectivas obras inclusive imputando ao próprio Poder-Público responsabilidades. São querelas jurídicas clássicas e que se estenderão ainda por meses ou anos. Uma vez que se aprove qualquer tipo de abrandamento das punições aos não pontuais, é de extrema coerência que os pontuais tenham benefícios fiscais (isenção ou redução do IPTU provisório, redução de ISS, etc)”, avalia.

Visão Jurídica
Na visão do advogado e Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB – MG — Ordem dos Advogados do Brasil, Kênio Pereira, a ideia desse projeto de incentivos da prefeitura de Belo Horizonte foi boa, pois a capital necessitava efetivamente de ampliar sua rede hoteleira. Porém, em sua opinião, faltaram critérios em termos de limitar o número de empreendimentos. “Sob o ponto de vista jurídico, o projeto atende a uma boa pretensão, mas diante do fato de muitas construtoras não terem conseguido inaugurar os hotéis, a aplicação da multa prevista na lei pelo descumprimento do prazo gerará um grande problema, pois quem poderá sair mais prejudicado são os adquirentes das unidades e não a construtora, pois essa, em alguns casos, não tem patrimônio para assumir os prejuízos que causou”, alerta.

Um dos casos mais polêmicos de novos empreendimentos que irão entrar em operação na cidade é o Site Savassi, o qual está sendo construído pela Paranasa juntamente com a Maio Empreendimentos, e que terá dois hotéis da rede francesa Accor, um da bandeira ibis Budget, e outro Novotel que estão com as obras bem atrasadas. Como se beneficiou da lei de incentivos da prefeitura de Belo Horizonte, deveria ter entrado em operação em fevereiro de 2014, mas está sem previsão de entrega.

Segundo Kênio Pereira, mais de 400 compradores das unidades desta obra constataram que a construtora hipotecou o empreendimento ao receber um empréstimo de R$ 80 milhões do banco do Brasil para ser aplicado na construção. “De forma inaceitável, o construtor desviou esses recursos para outros negócios. Diante da atitude irregular, pois a Paranasa/Maio Empreendimentos ignorou que o empreendimento está condicionado ao Patrimônio de Afetação, e ainda afrontou o contrato de empréstimo que determina a obrigação de aplicar os R$ 80 milhões na obra, vemos que já existem processos judiciais contra ela, pois não há clima de confiança para que sejam retomados os pagamentos de centenas de adquirentes. Eu, como advogado de alguns compradores, consegui o bloqueio das unidades que eles adquiriram, já que preferem rescindir o contrato e receber de volta o que pagaram, pois perceberam que aqueles que permanecerem como adquirentes terão que pagar muito mais do que foi previsto, para cobrir o rombo decorrente do desvio praticado pela construtora”, relatou o advogado.

Kênio Pereira – “Infelizmente, o ‘achismo’ é comum no Poder Público, o que resulta em leis falhas” Crédito da foto – Divulgação

Ele apresenta o argumento que se fosse utilizado o valor de R$ 80 milhões recebido pela Maio / Paranasa de empréstimo do Banco do Brasil, a quantia era suficiente para terminar a obra, sem recursos de investidores. “Considerando-se o valor do m² construído na região é de 1.599,68 (Tabela oficial do CUB do Sinduscon-MG – dezembro de 2014) e a metragem da edificação de 20.626,32 m², conclui-se que o Empreendimento Site Savassi custaria R$32.988.086,10. Entretanto, considerando a NBR que está registrada na incorporação junto ao Cartório do 4º de Registro de Imóveis, o valor total da obra, já incluído o lucro da construtora e da incorporadora é de R$74.071.812,14 em 2013. Fica assim evidente que só o empréstimo de R$80 milhões já cobriria o valor total da obra e ainda entrou recursos de mais de 400 investidores. Se os dois edifícios estão no esqueleto, ficou evidente o desvio dos recursos dos compradores e do empréstimo do Banco do Brasil”, explica Kênio.

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Opinião discordante
A Maio Empreendimentos discorda desta afirmação do advogado Kênio e informou que as obras do Site Savassi foram retomadas no final de 2014 e que o empréstimo de R$ 80 milhões junto ao banco do Brasil foi na modalidade de financiamento de capital de giro. “Este empréstimo fez parte de uma operação financeira maior, destinada ao financiamento das obras de todos os hotéis em implantação. A Maio obteve financiamento de R$ 80 milhões junto ao Banco do Brasil, na modalidade ‘financiamento de capital de giro’. Não houve exigência de patrimônio de afetação e nem vinculação com o Site Savassi, por não se tratar de financiamento via ‘Plano Empresário’ no qual estas condições são exigidas pelo agente financiador. Por essa razão, não procede o argumento que ‘a Justiça afirma que os recursos não foram aplicados na obra’. Essas informações que prestamos sobre o financiamento são de domínio público, constantes da matrícula do imóvel, na qual são transcritos os principais pontos do contrato assinado com o banco do Brasil. A dificuldade enfrentada pela Maio foi a não viabilização da segunda etapa do financiamento para todos os hotéis, em razão da mudança do cenário econômico que mudou a disposição dos agentes financeiros para concessão de financiamentos”, explicou o diretor da Maio Empreendimentos, Jânio Valeriano.

Em relação ao bloqueio de bens da Maio / Paranasa por ações de investidores, Valeriano informa que: “Apenas três investidores intentaram esta medida de bloqueio. Em dois casos, foram obtidas decisões favoráveis aos adquirentes em primeira instância, mas as medidas foram suspensas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. No terceiro caso, o processo encontra-se no Tribunal para análise do pedido de revogação do bloqueio, com grandes chances de reversão da medida”.

Ele acredita que no médio e longo prazo o ibis Budget e o Novotel Savassi proporcionará retorno adequado aos seus investidores. “O investimento hoteleiro não pode ser especulativo e nem encarado como de curto prazo, sendo esta visão compartilhada por consultores e investidores que conhecem o segmento de hotelaria. O mercado de Belo Horizonte passará nos próximos anos por um ciclo semelhante ao que houve nos anos 1999 a 2003, aproximadamente, quando a taxa média anual de ocupação dos hotéis girava em um patamar de cerca de 40%. Nos anos seguintes houve significativa evolução, atingindo cerca de 75% em anos recentes. Deverá haver um período de acomodação do mercado, que será tanto menor quanto melhor for o desempenho da economia”, assegura Valeriano.

A Accor, na qualidade de futura operadora hoteleira do empreendimento Site Savassi, se manifesta preocupada com a situação e que também partilha dos mesmos anseios dos adquirentes com relação ao cumprimento dos prazos de construção do empreendimento sob a responsabilidade da Maio/Paranasa, sem o qual não poderá desenvolver as atividades hoteleiras contratadas. A Accor ressalta ainda que o empreendimento é de interesse para ser administrado, mas diante dos atrasos na obra e de questionamentos jurídicos de investidores, encaminhou à Maio/Paranasa uma notificação extrajudicial solicitando uma solução efetiva dessa situação, e que está mantendo contato próximo com a empresa para auxiliá-la nesse sentido.

E a preocupação da Accor no ponto de vista do advogado Kênio faz sentido. “A princípio a administradora em geral não assina o contrato de compra e venda com os adquirentes das unidades hoteleiras. Assim, ela tem como sair do negócio, cabendo aos adquirentes analisarem cuidadosamente se a escolha do empreendimento decorre de quem será a administradora. Se é condição essencial para definir pela compra, que seja o hotel administrado pela Administradora XY, cabe ao comprador fazer inserir essa condição no contrato, pois se houve troca poderá então rescindir o contrato sem qualquer pagamento de multa. Mas, havendo prova de que os adquirentes foram induzidos a erro, poderá vir estes a requerer a indenização contra a construtora/incorporadora, bem como, se ficar provado o conluio, também contra a administradora”.

Um renomado advogado de Belo Horizonte, especializado em direito imobiliário que pediu para não ser identificado, é taxativo quando diz que as administradoras também agiram de forma irresponsável ao colocar sua marca num empreendimento que sabia que era de alto risco e poderia lesar muitos investidores. “O sujeito estava passeando com a família num final de semana em Belo Horizonte e deparava com imponentes estandes de vendas com enormes placas dizendo. Venha ser dono de um hotel. A primeira informação que o corretor de vendas lhe passava era o nome da bandeira e da administradora e isto era fator preponderante na decisão de compra. Por isto, as administradoras possuem culpa sim no cartório e devem ser acionadas na justiça, pois ninguém empresta seu nome e sua marca para outra pessoa vender um bem sem conhecer os riscos. Houve sim má fé de incorporadoras, construtoras, corretoras que vendiam uma unidade hoteleira sem mencionar os riscos ao investidor. Havia promessas absurdas de retorno de 1,5% ao mês, inclusive em folders de vendas, quando uma taxa de 0,7% era a rentabilidade máxima do setor que não tivesse instável. E vai me dizer que as administradoras não sabiam disto? Elas foram gananciosas e cobiçaram ganhar muito dinheiro e para isto emprestou seu nome e ele foi usado de má fé por muitos empresários picaretas e a prefeitura de Belo Horizonte fez vista grossa”, desabafou o advogado.

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Possíveis caminhos
Embora o cenário não seja favorável para os próximos anos, algumas medidas poderão ser adotadas para que o impacto da superoferta de leitos hoteleiros não prejudique a hotelaria mineira, como, por exemplo, apostar e fomentar a indústria de eventos. De acordo com Stella Kleinrath, Diretora de Promoção Turística da Belotur, o incentivo concedido pela prefeitura para os meios de hospedagens em Belo Horizonte conseguiu reverter a situação em que se encontrava o parque hoteleiro local: deficitário em termos de números de leitos e com defasagem quanto ao padrão exigido em destinos competitivos para a realização de eventos expressivos e geradores de movimento econômico. “O número de novos estabelecimentos resulta da meticulosa análise de viabilidade de mercado por parte dos investidores. Acredito que o mercado está se readequando à nova situação. Muitos meios de hospedagem estão afinando sua força de trabalho e a política comercial. A nova infraestrutura permite que o esforço para a captação de eventos seja intensificado. Em dezembro de 2014 foi criado o Grupo de Trabalho Especial de Captação de Eventos de Belo Horizonte, que conta com a participação da Belotur, BH Convention & Visitors Bureau, Associação Médica de Minas Gerais, Prominas, a academia, dentre outros”, comentou.

Uma solução que muitos especialistas apontam para alavancar as taxas de ocupação da hotelaria de Belo Horizonte é a construção por parte da prefeitura de Belo Horizonte do novo centro de eventos que ficará nas proximidades na Av. Cristiano de Machado. Mas Stella afirma que para sua viabilização, deveriam ser analisados dois aspectos: “primeiro, uma grande parte dos eventos técnicos-científicos realizados em Belo Horizonte conta com cerca de 300 a 500 participantes. Outra grande parte é de feiras e exposições. Para estes nichos a capital mineira apresenta boa oferta de equipamentos. O projeto foi recentemente discutido com investidores que solicitaram alterações para garantir a sua viabilidade. Assim que a justiça conceder a propriedade do terreno para a Prefeitura – a posse já está equacionada -, a licitação pode ser aberta. Ocorre que, considerando aqui também o cenário positivo de desenvolvimento urbano e econômico, investidores privados já apresentaram outros projetos para centros de convenções, como é o caso do Centro de Convenções vertical da Associação Médica de Minas Gerais, na Avenida João Pinheiro”, relata. Segundo Stella, deverá ser inaugurado no segundo semestre desse ano o Centro de Eventos do Complexo Turístico da Moda Fashion City Brasil, com uma área de 15 m², além da reabertura do processo de licitação do Expominas II.

Para a CEO da Vert Hotéis e ex-secretária de Turismo de Minas Gerais, Érica Drumond, o novo centro de eventos é de vital importância para tirar a hotelaria da capital mineira da situação que se encontra. “Não vou descansar enquanto o novo centro de convenções não ficar pronto. Belo Horizonte é a grande porta de entrada do turismo de Minas Gerais. A hora que a hotelaria de Belo Horizonte afundar, afunda todos os destinos turísticos do Estado. Ter uma taxa de ocupação baixa e com nível acentuado de queda é preocupante. Temos que nos unir para rever a política de redução do IPI para o retrofit hoteleiro, assim como do imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços. Existe uma complexidade de arrecadação de impostos muito grande no Brasil e na hotelaria não é diferente. Espero terminar 2015 pagando todos nossos impostos e manter todo nosso quadro de colaboradores, pois a esperança de que a realidade se reverta é somente em 2016. Temos que cobrar ações efetivas de nossas autoridades atitudes”, concluiu Érica.

Na opinião de Pablo Ramos, uma das soluções para amenizar os danos que esta lei de incentivos trouxe, seria transformar os leitos hoteleiros em salas comerciais, como já vem ocorrendo nos últimos meses. “Como o problema já existe, o que deve ser feito é alguma ação que resolva ou pelo menos amenize esta questão. Ao transformar as os leitos em salas comerciais, os hotéis que investiram um montante expressivo para conseguir cumprir a data estipulada pela lei sofreriam menos com a demanda reprimida de BH. O que vejo, é que quando esta lei de incentivos foi lançada, houve total despreparo e falta de análise da prefeitura ao elaborar esta regra. Para realmente atender a necessidade hoteleira do município, ela deveria ter criado um critério de avaliação melhor, ao invés de aprovar todos os projetos, pois esta atitude acarretou em um quadro negativo para a rede hoteleira da cidade. Além do alto número de leitos, esta regra acarretou, principalmente no mercado de trabalho, causando pelo menos demissões de 30% dos funcionários”, frisou.

Projeções concretas
Na visão do consultor Slyus, a lei 9.952 não tratou exclusivamente de incentivos a construção de hotéis. Segundo ele, a lei também abarcou projetos visando estimular o desenvolvimento de projetos ligados a saúde pública, turismo cultural e de negócios, tendo como fim obter incrementos na geração de empregos (renda) e arrecadação (impostos). “Nesse contexto a lei cumpriu razoavelmente sua missão. A arrecadação municipal aumentou e mais empregos diretos e indiretos beneficiaram a hotelaria, entre outros. Considerando os gastos para a realização da Copa 2014 (que motivou a criação dessa lei) estimados em R$ 1,22 bilhões, sendo R$ 451 milhões em receitas diretas ao Município, recebemos nos novos hotéis em funcionamento 355 mil visitantes no período da Copa, nossa ocupação média atingiu 71,5% (98% em dias de jogos) e foram 159 mil hóspedes registrados (+19% em relação ao ano anterior) com acréscimo de 68% no RevPar, uma vez que as diárias médias foram excelentes. Acredito que BH cumpriu a altura seu papel, deixou seu legado quanto a infraestrutura hoteleira. Falta evidentemente o Poder Público cumprir suas promessas e entregar revitalizados o Expominas, o Minascentro e o Parque de Exposições Bolivar de Andrade. A execução do WTC (Centro de Convenções da Prefeitura) segue apenas nas pranchetas e a conclusão da expansão dos aeroportos Pampulha e Confins ainda em nosso imaginário. A hotelaria precisa e conta com seus elementos de apoio para conceder seus esperados resultados aos investidores e a todos que dela dependem”, finaliza.

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